A Bibliex lançou o livro Mulher de Militar, de Dímia Fargon, que contém um belo relato dos dois anos que ela e o marido passaram em Bagdá, no início dos anos 80. Li o testemunho da autora e confirmei o que já sabia, só que com um enfoque diferente, o de uma dona de casa vivendo no país de Saddam Hussein.
No início dos anos 80, havia um grande contingente de brasileiros no Iraque. Destacavam-se empresas como a Avibras e a Engesa, que vendiam armamentos, a Volkswagen do Brasil exportava para aquele país milhares de carros, e a centenhas de brasileiros viviam num acampamento da construtora Mendes Júnior próximo à região de conflito entre o Iraque e o Irã.
Eu mesmo estive no Iraque em 1998 e pude constatar a excelência de suas rodovias e repartir as ruas de Bagdá repletas de Passat com seus parabrisas traseiros estampando um adesivo escrito "Made in Brazil".
A estreita ligação do Brasil com o Iraque derivou do choque do petróleo de 1973. Nossa economia foi fortemente abalada com as sucessivas altas daquele produto, forçadas pela OPEP como forma de castigar o ocidente pelo apoio a Israel.
Nossa diplomacia era mais destemida naquela época e estreitamos os laços com o Iraque. Havia um embargo contra aquele país, que nacionalizara a exploração de seu petróleo.
Saddam Hussein queria desenvolver rapidamente seu país e projetar-se como grande líder no Oriente Médio. Para isso, associou-se ao Brasil, que precisava aliviar o imenso déficit na sua balança comercial devido à importação do petróleo. No final dos anos 70, o Brasil , tinha capacidade técnica para conduzir as obras de infraestrutura que o Iraque necessitava; possuía uma indústria de material bélico com produtos de boa qualidade; e, de quebra, conduzia um programa de desenvolvimento da tecnologia nuclear.
Esse último aspecto foi o principal motivador da espionagem de americanos e israelenses em nosso país.
De uma forma ou de outra, nosso pais continuou vinculado ao Irã e Iraque.
Em 2002, o diretor-geral da Organização para a Proibição de Armas Químicas, o embaixador brasileiro José Bustani, sofreu um forte ataque dos EUA por causa de suas ações que buscavam convencer o Iraque a aderir àquela organização. Caso os iraquianos concordassem em receber inspetores daquela organização internacional, os americanos perderiam o principal argumento para a invasão daquele país no ano seguinte.
O brasileiro José Bustani havia sido reeleito para o cargo em 2000, com apoio dos EUA. Dois anos depois, os americanos o retiraram do cargo sob alegação de incapacidade administrativa.
Continuando a história, no final da década passada o presidente do Brasil, Lula, surpreendeu o mundo ao tentar, com seu congênere turco, uma solução para o problema do programa nuclear iraniano. A ação brasileira também sofreu forte ataque de americanos e israelenses.
O recente vazamento de informações de Edward Snowden mostra que, naquela ocasião, os EUA também espionaram o Brasil em busca de informações que fundamentassem a ação da diplomacia americana para impor sanções ao Irã.
Esses fatos devem ser divulgados para que nós brasileiros saibamos que não estamos tão distantes como julgamos estar dos principais conflitos internacionais, nem imunes a ações hostis de outros países.
http://www1.folha.uol.com.br/fsp/mundo/122117-alvo-antigo.shtml
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