Publicado
pelo Correio Brasiliense e transcrito na Resenha do Exército
ANGOLA
Muito além da paz
Fim da
sangrenta guerra civil aqueceu a economia, mas a nação africana sofre com o mau
gerenciamento dos recursos financeiros. Acusado de perpetuar-se no poder, o
presidente José Eduardo dos Santos divide paixões
Poucos
países experimentaram o alívio do fim de uma guerra como Angola. Há 10 anos, as
duas principais forças políticas locais assinaram um acordo de paz que terminou
com mais de duas décadas de luta armada, fora o período de conflito pela
independência de Portugal. O resultado é que Angola viveu um boom econômico, com o Produto Interno
Bruto (PIB) crescendo mais de 800% em nove anos. Estradas foram
construídas, a população rural voltou a plantar suas lavouras e nações como o
Brasil passaram a investir no recém-nascido mercado consumidor. Mas o país
ainda patina quando o assunto é desenvolvimento. Angola ocupa a 146ª posição no ranking da ONU e, segundo
o próprio governo, 36,6% da população vivem abaixo da linha de pobreza.
Ao
contrário do que pode parecer, o problema não é falta de dinheiro. Com grandes
reservas de petróleo, a principal fonte de renda é a exportação do recurso para
a China e para os Estados Unidos. Os ganhos, porém, acabam voltando para a indústria petroleira,
e há pouco investimento em outros setores da economia, uma prática suicida a
longo prazo. “Angola não recebe ajuda financeira de outros países por causa
disso. O mundo percebeu que não há carência de dinheiro, mas sim de
gerenciamento”, afirma Assis Malaquias, analista angolano do Africa Center for
Strategic Studies.
Esse modelo
de negócios deu origem a uma
gigantesca desigualdade social, fortalecida pela corrupção do governo. “O principal problema é o uso da
infraestrutura para fins comerciais e políticos. Muitos membros do poder
são sócios das empresas contratadas”, aponta Justin Pearce, um especialista em
política angolana na Faculdade de Estudos Orientais e Africanos, em Londres.
Para se ter uma ideia, antes das eleições legislativas de 2008, houve um
impulso para a finalização de obras públicas, que hoje se encontram aos
pedaços. “Estradas construídas há apenas quatro anos já estão ruins e, na
capital Luanda, um hospital que não havia recebido um doente sequer teve que
ser desativado, por conta da qualidade das obras”, conta Pearce, autor do livro
An outbreak of peace: Angola's situation of 'confusion (sem tradução para o
português).
Em meio a
esse cenário, está o presidente José Eduardo dos Santos, líder do Movimento
Popular de Libertação da Angola (MPLA), no poder desde 1979.
Foram as
forças coordenadas por ele que mataram Jonas Savimbi, líder rebelde da União
Nacional para Total Independência de Angola (Unita), e, com isso, puseram fim à
guerra, em 2002. O empenho de Santos para a assinatura do acordo de paz faz com
que ele seja visto por muitos angolanos como a figura da pacificação. Isso não
significa que ele seja uma unanimidade. “Muitos jovens não gostam da ideia de
ele estar no poder nas últimas três décadas, sem que tenha sido eleito pelo
voto popular. Mas muitas pessoas o amam; a maioria porque recebe benefícios do
regime”, diz Assis Malaquias.
Repressão
José
Eduardo dos Santos prometeu eleições legislativas para setembro, mas continua
sufocando a oposição. Segundo especialistas, o MPLA deve ganhar a maioria outra
vez, por conta do controle que o partido exerce sobre os meios de comunicação e
sobre a comissão eleitoral.
“Nos
últimos meses, têm ocorrido mais episódios de violência da polícia e de
capangas do governo contra ativistas de oposição de aldeias e províncias”,
denuncia o professor Justin Pearce. “Não se trata de instabilidade, mas de
repressão.” A expectativa é que Santos permaneça no poder até, pelo menos,
2017.
Comentário
do Ilha: Os ganhos com o petróleo deveriam ser investidos em outros setores da
economia e também para fins sociais. Essa questão guarda relação com o Brasil
na discussão da repartição dos Royalties do Pré-sal. O petróleo é um recurso do
país, não da indústria petrolífera.
Publicado
pela Folha de São Paulo e transcrito na Resenha do Exército
Troca de
emprego se acentua no Brasil
Soma de
contratações e demissões atinge pico de 116 para cada 100 trabalhadores
ocupados em 2010, diz IPEA
Estudo
indica que avanço da renda e expansão do setor de serviços contribuíram para
maior rotatividade
PEDRO
SOARES
EM SÃO
PAULO
Com o
avanço da renda do brasileiro nos últimos anos, o consumo sofisticou-se e o
setor de serviços ganhou peso na economia. Um reflexo desse movimento foi o
crescimento da rotatividade do mercado de trabalho, já que empregados de
restaurantes, hotéis, empresas de telemarketing, informática, telefonia e
outras têm trocado de trabalho mais rapidamente.
Segundo
estudo do Ipea (Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada), contribui para isso
uma mudança de "cara" dos empregadores com a expansão dos serviços,
concentrados mais em empresas menores. Essas firmas demitem e contratam com
mais velocidade -às vezes, como forma de reduzir custos.
Carlos
Henrique Corseuil, do Ipea, ressalta que a causa da rotatividade poderia, em
tese, ser a alteração do perfil dos empregados, mas jovens e pessoas com baixa
escolaridade -que tendem a trocar mais de emprego- perdem espaço na força de
trabalho.
Segundo o
estudo, a soma de todas as
contratações e demissões representava 89,2% da força de trabalho formal do país
(dados do Ministério do Trabalho) na média de 1996 a 2000. Passou para
106,2% na de 2006 e 2010.
Ou seja, a
cada 100 trabalhadores que estavam empregados, ocorreram 106 admissões e
desligamentos no intervalo de um ano. Em 2010, esse giro no mercado de trabalho
chegou ao pico de 116 para grupo de 100 ocupados.
A maior
rotatividade acompanha quase que de modo constante o aumento do rendimento -que
proporciona o maior consumo de serviços.
Para
Altamiro Carvalho, economista da Fecomercio-SP, "a migração de uma grande camada da população para
"nova" classe média permitiu o acesso e diversificou o consumo".
Entraram na "cesta de compras" de muitas famílias serviços de
comunicação, turismo, alimentação fora de casa e outros.
"Há
uma procura por profissionais mais qualificados muito acirrada entre as
empresas do setor de serviços para atender melhor, o que impulsiona a
rotatividade e aumenta os salários."
Tal
tendência, afirma Carvalho, persistiu em 2011 e deve se repetir neste ano, a
menos que a crise europeia se agrave muito, aumente o desemprego, contraia a
renda e reprima o consumo.
RENDA
Segundo
levantamento da Folha com base em dados do IBGE, a renda no setor de serviços cresceu 3,4% na média de
2010 e 2011, nas principais metrópoles, enquanto na indústria avançou só 0,4%.
"Há
uma superdemanda e as pessoas recebem propostas para ganhar mais. Empresas de
alguns segmentos tiveram de dar reajustes de até 15% para reter
profissionais", diz Paulo Solmucci, presidente da Associação Brasileira de
Bares e Restaurantes.
Quando uma economia fica mais madura e supera a
renda per capita de US$ 10 mil, diz, há um aumento gradual do consumo de
serviços.
Comentário
do Ilha: Os dados indicam que o setor de serviços tem se expandido com mais
vigor que a indústria, o que caracteriza uma economia pós industrial. A
rotatividade nos empregos tem favorecido os trabalhadores mais qualificados.
Seus ganhos são mais expressivos que os alcançados pelas pressões dos
sindicatos, que são estruturas da época do Estado Novo e que precisam ser
revistas.
Publicado
pelo Estado de São Paulo e transcrito na Resenha do Exército
O etanol
em crise
Há quatro
anos, a produção nacional de etanol de cana-de-açúcar era considerada um
sucesso - que não saiu de graça, considerados os custos dos subsídios ao
Proálcool, lançado na década de 1970. Contudo, os investimentos feitos pelo
setor sucroalcooleiro e a introdução
de melhorias genéticas nas plantações permitiram a dispensa de subsídios
e a preservação da paridade com o preço da gasolina. Com a introdução dos veículos flex ou
bicombustíveis a partir de 2003,
a produção de álcool avançou rapidamente, tendo
alcançado 648,85 milhões de toneladas em 2008. Projeção feita na época
pela Petrobrás era de que esse volume triplicaria até 2020, atendendo
plenamente à demanda interna e transformando o Brasil em grande exportador
mundial do produto.
Em vez
desse quadro, temos hoje a
virtual estagnação da produção de álcool no País, refletindo a crise que
se abateu sobre o setor, com o elevado endividamento de muitas usinas, várias
delas colocadas à venda. Somente em São Paulo, que é o maior produtor nacional
de etanol, entre 30 e 40 usinas (20% do total instalado no Estado) encontram-se
nas carteiras de venda de corretores ou negociam acordos para fusões, parcerias
ou incorporações. No Paraná, as coisas não são melhores: das 30 usinas do
Estado, 3 unidades deixarão de moer cana na safra 2012/2013.
Esse novo quadro surge justamente em uma fase
em que o petróleo alcança elevadas cotações - o que deveria tornar os
biocombustíveis mais atraentes. A crise do etanol no Brasil também coincide com a decisão do governo
dos EUA, por motivos fiscais, de eliminar o subsídio ao etanol de milho e
acabar com a sobretaxa sobre o etanol importado, uma abertura que os produtores
nacionais há anos reivindicavam.
Na
realidade, o País hoje não
tem etanol nem mesmo para atender à demanda interna. Há muitas usinas
que, além de quebra de safras, não podem contratar novos financiamentos na rede
bancária e não têm recursos para renovação da lavoura ou aquisição de
equipamentos. Estão em melhor situação as usinas que tiveram meios para optar
pelo aumento da produção de açúcar, aproveitando as altas cotações
internacionais, reduzindo a produção de álcool combustível. Outras, as chamadas
refinarias, não tiveram essa alternativa, e não puderam reajustar os seus
preços para absorver o aumento de custos, em vista do virtual congelamento do
preço da gasolina, que já dura seis anos. Como resultado, o álcool hidratado,
cujo preço, para atrair consumidores, deve corresponder a 70% do da gasolina,
perdeu mercado.
Tem havido um volume significativo de
investimentos externos em refinarias de etanol, mas a aquisição de novos
equipamentos está em queda. Os quatro projetos que entraram em operação em 2011 resultaram de
decisões tomadas antes de 2008, como informa José Luiz Oliveira,
vice-presidente da Dedini, indústria de equipamentos para a produção de etanol.
"O que houve de lá para cá, foram apenas projetos de diversificação de
empresas, nenhum de ampliação da capacidade", diz Oliveira. Com a queda de
73% de seu faturamento em relação a 2008, a empresa reduziu seu quadro de pessoal
de 6.500 funcionários para 3.500.
Seria
simplista dizer que, se o preço da gasolina for reajustado pelo governo, os
problemas dos produtores de etanol desapareceriam. Por um certo prazo, pode ser
que sim. Mas o que
claramente está faltando é definir o papel do etanol na matriz energética
brasileira. Uma coisa é produzir o volume de álcool anidro necessário à
adição à gasolina, hoje na proporção de 20%. Outra, bem mais complexa, é tornar
o álcool hidratado competitivo no mercado, o que exige garantia de
abastecimento, com crescimento da produção e formação de bons estoques
reguladores. Sem isso, a participação no mercado interno continuará muito
instável, e será virtualmente impossível a conquista de mercados externos.
Infelizmente,
a solução do problema do
álcool não depende do livre jogo das forças de mercado e, sim, de uma decisão
da cúpula do governo.
Comentário
do Ilha: O artigo não revela os motivos da crise de abastecimento de etanol.
Uma explicação recorrente é que os usineiros preferem produzir açúcar, que
apresenta melhor retorno financeiro. Nesse aspecto, o articulista tem razão ao colocar
no governo, e não no mercado, a tarefa de solucionar essa crise.
Publicado
pelo Globo e transcrito na Resenha do Exército
Armas
não letais?
RICARDO
BALESTRERI
Tenho
acompanhado com atenção a discussão sobre a utilização de armas não letais, em particular
das pistolas elétricas incapacitantes. Cada vez mais esses dispositivos têm
sido usados pelas polícias de todo o planeta - o que é, ao mesmo tempo, bom e
ruim.
Bom porque, se não existisse opção à arma de
fogo, haveria um incalculável número de mortes desnecessárias. Ruim porque,
quanto mais essa tecnologia é usada, maior a possibilidade de o ser de forma
equivocada. E o fato é
que, mal utilizadas, as armas não letais podem, sim, apesar do nome, matar.
Isso é grave.
Há fortes
indicativos de que esse teria sido o caso das duas mortes ocorridas na
Austrália e em Santa Catarina, que têm em comum o uso de pistolas de
imobilização. Múltiplos disparos, uso cumulativo de outro dispositivo não
letal, disparos de longa duração, indivíduos atingidos sob forte influência de
drogas e/ou bebida alcoólica, podem explicar em parte tais casos,
proporcionalmente raros se tomarmos em conta o número anual de disparos em todo
o mundo.
É preciso
compreender, entretanto, que entre o cassetete e a arma de fogo há todo um
leque de possibilidades. E que as tecnologias não letais existem para ocupar
esse espaço. Elas são fundamentais, por exemplo, no controle de distúrbios,
como brigas de torcidas, rebeliões e arrastões. Imprescindíveis na segurança de
agências bancárias, shoppings e eventos fechados. A pistola elétrica, cada vez
mais disseminada nas polícias de todo o mundo, no Brasil inclusive, é só uma
delas.
Mas não
servem para todas as situações. O que não significa que devam ser banidas.
Seria um retrocesso e aumentaria em muito os índices de letalidade em
confrontos envolvendo forças de segurança. Melhor discutir o uso das
tecnologias não letais. Debater a regulamentação do uso desses dispositivos
pelas forças de segurança; criar normas para garantir a qualidade dos produtos
que entram no mercado; estabelecer doutrinas para a aplicação daquilo que a ONU
convencionou chamar de "uso proporcional da força".
Quando
secretário nacional de Segurança Pública, incentivei fortemente a aquisição,
pela União, estados e municípios, de dispositivos não letais. Isso não ocorreu,
entretanto, sem a condicionante do treinamento, conforme estabelecido em 2007
pelo Pronasci, que foi um divisor de águas em propostas nacionais de redução de
letalidade pelas forças de segurança.
Até então,
a lógica era bem distinta. As polícias só dispunham, às vezes para uso
banalizado - com raras exceções -, de pistolas, de revólveres, de
submetralhadoras e, em casos como o do Rio, até de fuzis, cujos projéteis podem
atingir alvos a mais de dois quilômetros de distância. Não era de se admirar as
estatísticas de mortes por balas perdidas e que tenhamos vivido episódios
lamentáveis como os massacres do Carandiru e de Eldorado dos Carajás - que
poderiam ter tido outro desfecho caso as forças de segurança de então
dispusessem de equipamentos não letais adequados.
Tudo isso,
portanto, é muito recente. O
próprio termo "não letal" tem pouco mais de 20 anos: foi cunhado pela
Organização das Nações Unidas em seu VIII Congresso, realizado em 1990, em
Havana, quando tratou de como disciplinar o uso da força pelos agentes da lei.
Considero o
termo "não letal" mais apropriado que "menos letal" ou
"menos que letal" (do inglês "less than lethal"), pois ao
chamar esses equipamentos de não letais embutimos o comprometimento com seu
objetivo. Não se trata de simples palavreado.
As armas não letais não são feitas para matar,
mas para imobilizar temporariamente sem causar danos irreversíveis. Se usadas conforme seus manuais,
não matam. O Brasil levou quase duas décadas para compreender esse conceito, do
uso proporcional da força, preconizado pela ONU, e adotar os equipamentos que
permitem a sua execução.
O mundo,
infelizmente, não é cor de rosa. O esforço deve ser no sentido de que essas
tecnologias sejam usadas corretamente. Sim, elas causam dor, ardência, choque,
lágrimas. Mas, ruim com
elas, pior sem elas.
Comentário
do Ilha: Na semana passada, alguns setores da sociedade criticaram o uso de
armas não letais, vistas como um mal por si mesmo. Essa crítica é infundada.
Armas não letais são mais apropriadas para forças de segurança pública e,
quando utilizadas devidamente, são muito mais seguras que as demais.
Publicado
pelo Globo e transcrito na Resenha do Exército
O
crescente isolamento da Argentina
Governos de corte populista frequentemente
recorrem a "inimigos externos" para desviar a atenção de dificuldades
internas. A presidente
da Argentina, Cristina Kirchner, embarcou neste expediente ao recolocar na
ordem do dia a disputa com a Grã-Bretanha pelas Ilhas Malvinas - e os 30 anos
da invasão argentina este mês, que deveriam ser lembrados discretamente,
ganharam uma dimensão que, se não chega a ser perigosa, é bastante fútil.
O que interessa à Casa Rosada é
disfarçar as dificuldades econômicas e políticas sob a retórica do complô dos
"inimigos externos", ao denunciar a suposta ameaça de
"militarização do Atlântico Sul" - porque a Grã-Bretanha
decidiu enviar um moderno destróier às águas adjacentes às Malvinas - e ao
esbravejar sobre a necessidade de "recuperar a soberania energética
nacional". São discursos que encontram eco nos sentimentos nacionalistas
dos argentinos, desde os tempos de Perón, mas carecem de sustentação real.
A YPF é um desses entes que datam dos tempos de
Perón e já respondeu por quase a totalidade do petróleo consumido no país. Nos anos 90, contudo, conseguiu a
proeza de ser uma petrolífera que dava prejuízo. Foi então privatizada em 1998,
com o apoio de Néstor e Cristina Kirchner, tendo 48% de seu capital comprados
pela espanhola Repsol. Hoje, com o país obrigado a importar energia, a
Repsol-YPF ganhou fama de vilã e o governo manobra para reestatizar a empresa.
Famílias poderosas com ligações com os Kirchner agradecem. Enquanto o governo
federal não se decide, instrui províncias (estados) aliadas a cassar as
concessões da petroleira. Já o fizeram Chubut, Rio Negro, Salta , Mendoza,
Santa Cruz e Neuquén.
Nem por ser
o principal parceiro da Argentina no Mercosul o Brasil escapa de medidas
protecionistas ou "nacionalistas" adotadas para "proteger"
o país de vilões externos que, segundo o discurso oficial, se comprazem em
prejudicá-lo. Esta semana, a província de Neuquén cancelou uma área concedida à
Petrobras, alegando que ela "permanece sem produção, sem comprovação de
reservas e sem investimentos suficientes". A Petrobras diz ter sido
apanhada de surpresa.
O jornal
espanhol "El Pais" destacou que "o discurso populista, as
ameaças de nacionalização e a pressão sobre os capitais estrangeiros são razões
suficientes para que a comunidade internacional retire sua confiança na
estabilidade regulatória argentina." Reflexos disso são o anúncio do
presidente Barack Obama que suspenderá as preferências comerciais de que gozava
a Argentina e a decisão de EUA, UE, Japão, México e outros dez países de denunciar
à OMC as políticas protecionistas argentinas.
Embora a
economia cresça, o país sofre com déficit energético crônico, com as distorções
provocadas pela maquiagem de índices como o de inflação e começa a ter
problemas de desabastecimento. A Casa Rosada prefere mascarar os problemas
atrás do discurso nacionalista e ameaça levar a Argentina a um lamentável
isolamento, cujo maior risco é transformar a nação em pária internacional.
Comentário
do Ilha: A economia do país vizinho não está bem. Ali, não funcionou o paradigma
da privatização como solução para todos os males.
Publicado
pelo Globo e transcrito na Resenha do Exército
Malária
resistente se espalha
Mutação
genética faz parasita altamente letal ficar imune a coquetel de remédios
Cláudio
Motta
claudio.motta@oglobo.com.br
UM
MOSQUITO Anopheles gambia
Uma mutação genética fez a malária - uma das
doenças infecciosas que mais mata no mundo - ficar resistente aos remédios
usados em seu tratamento.
Pesquisas recém-publicadas identificaram na fronteira entre Camboja e Mianmar
cepas contra as quais a artemisinina
já não faz o efeito esperado. O medicamento contribuiu para que a letalidade caísse 30% na última
década. Mesmo com esta queda, houve 665 mil vítimas da doença em 2010:
mais de uma morte por minuto. No mesmo ano, 1,8 milhão de óbitos foram causados
pela Aids.
Se o
tratamento com artemisinina falhar, faltam alternativas. Os esforços para desenvolvimento
de novas drogas não deverão gerar antimaláricos até o final da década.
Um dos coordenadores da pesquisa publicada na revista "Lancet",
resultado da cooperação internacional liderada pelo Instituto de Pesquisa Texas
Biomed, Tim Anderson, informa que as razões pelas quais houve a mutação
genética ainda são desconhecidas.
- Tentamos
identificar as mudanças genéticas envolvidas na resistência. Se conseguirmos,
teremos pistas de como este parasita se tornou resistente - disse Anderson ao
GLOBO. - Esta informação poderá permitir que façamos mudanças nos medicamentos
para prevenir a resistência. Já identificamos a região do genoma do parasita
envolvida (na mutação), mas não determinamos quais foram as mutações.
Remédio
passa a agir lentamente
O pesquisador
faz referência a outro estudo, publicado simultaneamente na revista
"Science" pelo mesmo grupo de cientistas. A esperança é que, com a
identificação da região genética das mutações, seja possível gerar marcadores
moleculares que permitam monitorar a propagação das cepas resistentes aos
medicamentos.
A disseminação da cepa de malária resistente
preocupa. Ela
atravessou cerca 800 quilômetros do Camboja, tendo sido previamente relatada na
fronteira deste país com a Tailândia. Os primeiros casos apareceram em 2006,
motivando um esforço internacional para controlar o Plasmodium falciparum.
Entre 2001
e 2010, os cientistas analisaram 3.202 pessoas com a doença e constataram que o
remédio agia mais lentamente em 0,6% dos casos em 2001, percentual que pulou
para 20% em 2010. De
acordo com Anderson, o aumento do tratamento com artemisinina contribuiu para a
disseminação de sua resistência.
- Os
parasitas resistentes sobrevivem e tende a ocorrer um aumento de sua frequência
- explicou Anderson. - Esta malária resistente também pode chegar ao Brasil.
Basta que uma pessoa infectada voe do Sudeste da Ásia para o país.
Além da
importação do parasita resistente, é possível que ele se desenvolva
independentemente na América do Sul, explica o especialista. Este fenômeno já aconteceu
praticamente ao mesmo tempo tanto na Ásia como na América do Sul com outras
drogas.
- Nossa
preocupação é que a artemisinina siga o mesmo padrão - comentou Anderson. -
Acho que a coisa mais importante é aumentar a vigilância da eficácia do tratamento
da terapia com a combinação de artemisinina. Dessa forma, será possível
detectar precocemente qualquer alteração na eficácia da droga. É fundamental que a artemisinina
seja administrada em combinação com outras drogas para atrasar a origem da
resistência. No Camboja, terapia apenas com artemisinina é amplamente
utilizada, mesmo que esta não seja a política oficial. Esta pode ser uma razão
para que a resistência tenha surgido no Camboja.
O Brasil
também usa artemisinina em seu coquetel antimalárico. Secretário de Vigilância
em Saúde do Ministério da Saúde, Jarbas Barbosa informa que o combate à doença,
concentrada na Amazônia, inclui o fornecimento gratuito de remédios, além da
análise das cepas. A Rede Amazônica para a Vigilância da Resistência de Drogas
Antimaláricas colhe amostras do parasita.
- A
resistência a antibióticos, antivirais, antiparasitas é uma tendência natural.
Este é um problema global - afirmou Barbosa. - O aumento progressivo da
resistência é facilitado por alguns fatores. Onde é necessário pagar, as
pessoas muitas vezes não têm dinheiro para realizar o tratamento completo.
Fonte: O
Globo
Comentário
do Ilha: Esse artigo é importante por suas implicações com a biossegurança.
Publicado
pelo Globo e transcrito na Resenha do Exército
A praga
da corrupção
Merval
Pereira
Enquanto no
país prevalecer a postura de tratar a corrupção dos aliados e correligionários
como uma questão política, e demonizar a corrupção dos adversários, não teremos
condições de controlar essa verdadeira praga, que não é "coisa
nossa", pois está espalhada pelo mundo globalizado, mas que tem encontrado
entre nós um acolhimento incomum devido à legislação frouxa e à cultura da
impunidade que por aqui impera.
Por isso,
quando volta e meia relatórios do Departamento de Estado dos Estados Unidos ou
de outro governo qualquer classificam nossa corrupção de endêmica, é preciso
entender a palavra como uma metáfora, e não ficar com o nacionalismo à flor da
pele.
Não se diz
que a corrupção no Brasil é endêmica por se tratar de uma doença típica dos
trópicos, por exemplo, mas para explicar que ela se espalhou pelo organismo
social do país, e essa parece ser uma verdade irrefutável.
No índice da Transparência Internacional, o
Brasil caiu da 45 para 73 posição entre 2002 e 2011, uma piora considerável
durante os governos petistas.
Mas o
partido que está no poder usava o combate à corrupção como sua marca antes de
chegar à Presidência, e tentou manter as aparências nos primeiros tempos de
poder central.
O
ex-ministro José Dirceu cunhou o slogan, que repetia seguidamente, "este é
um governo que não rouba nem deixa roubar", até que seu assessor político
Waldomiro Diniz foi denunciado por um vídeo, que o mostrava recebendo propina
do bicheiro Carlinhos Cachoeira quando trabalhava nas Loterias do Rio de
Janeiro no governo Garotinho.
O vídeo era
antigo, mas revelava uma aptidão de seu principal assessor no Congresso nada
adequada aos cargos que ocupava.
Com a
revelação do mensalão, e de métodos nada ortodoxos de atuação política de
petistas à frente de prefeituras pelo país, especialmente paulistas, ficou
claro que a diferenciação do PT dos outros partidos que acusava existia apenas
no marketing político.
Diferentemente
dos outros partidos, no entanto, no PT ser corrupto não invalida a atuação
política de um líder importante.
A
contrário, o partido, mesmo que tenha no primeiro momento que fingir estar se
livrando do filiado apanhado em flagrante, assume a proteção de seus políticos
acusados até que o tempo ajude a nublar a memória do cidadão mediano.
E todos vão
sendo acomodados novamente na burocracia partidária ou mesmo nos diversos
escalões dos governos que o PT assume, como se não devessem nada.
O caso do
senador Demóstenes Torres é emblemático. Seu ex-partido, o DEM, abriu um
processo de expulsão que o obrigou a se desfiliar, o mesmo tratamento dado
anteriormente ao ex-governador do Distrito Federal José Roberto Arruda.
Quem o PT expulsou de suas fileiras nos últimos
anos, quando escândalos de diversos quilates estouraram no seu colo?
Apenas seu
tesoureiro à época do mensalão, Delubio Soares, que nunca perdeu sua situação
de prestígio dentro do partido e foi finalmente reconduzido oficialmente de
volta no ano passado, antes mesmo do julgamento pelo Supremo Tribunal Federal,
numa tentativa de inocentá-lo publicamente antes do veredito oficial.
José Dirceu
continuou com tanta importância dentro do PT que se tornou um consultor de
empresas altamente requisitado justamente por seu prestígio pessoal junto aos
presidentes petistas e demais autoridades governamentais.
Ele mesmo
admitiu em entrevista que um telefonema seu tinha um peso diferenciado.
O PSDB teve o mesmo comportamento do PT em
relação ao hoje deputado federal Eduardo Azeredo, acusado de ter dado origem ao esquema do
mensalão na campanha em que se candidatou a governador de Minas com o mesmo
Marcos Valério que mais tarde surgiria organizando o mensalão petista.
É verdade
que Azeredo perdeu a presidência do partido e o prestígio interno quando o
escândalo estourou, e não conseguiu legenda para tentar se candidatar a
senador, tendo se contentado a disputar uma vaga de deputado federal.
Em sua
defesa, ele alega que sua situação nesse esquema é idêntica à do ex-presidente
Lula, que não foi envolvido em nenhuma investigação do mensalão do PT.
Essas
situações evidenciam que a questão da corrupção continua sendo um tabu entre
nossos políticos, e a tendência de absolver seus pares é quase uma questão de
autopreservação.
Agora mesmo
não se consegue quem queira presidir a Comissão de Ética do Senado para iniciar
um processo contra o senador Demóstenes Torres.
É
impensável que o Senado não encare esse problema, e o mais provável é que ele
seja julgado e condenado por quebra do decoro, mas todos os constrangimentos da
corporação estão expostos aos olhos da opinião pública.
Uma outra
característica de casos como os do bicheiro Carlinhos Cachoeira é que eles são
multipartidários, isto é, acabam envolvidos parlamentares de vários partidos,
independente de ideologia ou tendência política.
Por isso, a
CPI do Cachoeira dificilmente será aprovada, pois não interessa a nenhum dos
principais partidos: o PT, além de ter alguns deputados envolvidos nas escutas,
não quer remexer no caso Waldomiro Diniz às vésperas do julgamento do mensalão.
O PSDB tem
o governador Marconi Perillo perigosamente colocado em zonas de suspeição, já
tendo uma assessora pedido demissão depois de flagrada em conversas telefônicas
com Cachoeira em um Nextel.
Os dois,
aliás, deram desculpas esfarrapadas sobre seus casos. A assessora disse que foi
confundida com outra pessoa, e o governador que recebera o bicheiro a pedido do
senador Demóstenes, e que Cachoeira jurara que já abandonara a contravenção.
Os petistas
que acusam a mídia de ter "inventado" Demóstenes, transformando-o em
um ícone da oposição mesmo sendo ele quem era, esquecem-se do caso do
ex-ministro duas vezes Antonio Palocci, que nos governos Lula e Dilma foi
tratado pela mesma mídia como o grande garantidor do equilíbrio político e
econômico das gestões petistas.
Os dois, o
ex-ministro e o senador, realmente exerceram os papéis que a mídia lhes
atribuía. Só que, por baixo dos panos, tinham outras atividades desconhecidas
até serem denunciadas.
Comentário
do Ilha: Merval Pereira é um articulista sério e competente. Há muito poucos outros
como ele.
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