O TREM MAGNÉTICO DA CHINA
O Maglev (derivado do termo "magnetic levitation") usa levitação magnética para impulsionar veículos, que se movem com o uso de ímãs, sem necessitar de rodas, eixos e rolamentos. Com o Maglev, um veículo é levitado a uma curta distância de uma guia, usando ímãs para criar elevação e impulso. O veículo circula levitando, percorrendo uma guia correspondente aos trilhos das ferrovias convencionais. Para isso, utiliza forças eletromagnéticas entre ímãs supercondutores a bordo do veículo e de bobinas no chão.[1]
A grande diferença entre um trem Maglev e os trens convencionais é que sua força motriz é gerada por uma combinação de bobinas eletrificadas nas paredes das guias e a bordo dos trens.[2]
Figura 1 - Levitação e guiamento de um Sistema Maglev
Diferente dos trens convencionais, a tecnologia Maglev emprega um motor linear e utiliza eletromagnetos para direcionamento e suporte.
Figura 2 - Comparação entre o suporte, propulsão e guiamento de um trem convencional (a) e do sistema Maglev (b)
A origem do trem Maglev remonta ao ano de 1934, quando sua concepção foi patenteada por Hermann Kemper, na Alemanha. A tecnologia Maglev veio sendo desenvolvida paulatinamente a partir da década de 1960, e nos anos 90 foi submetida a diversos testes de desenvolvimento.[3]
O nível de prontidão de uma tecnologia é um indicador confiável de sua maturidade, ou seja, se ela está pronta para ser utilizada num novo produto. Assim, sua viabilidade comercial dependerá da comprovação de sua segurança e desempenho operacional[4].
Em maio de 1998, quando o governo alemão já havia investido 30 anos de pesquisa e cerca de US$ 2 bilhões no desenvolvimento da tecnologia, a Siemens AG e a ThyssenKrupp AG criaram o consórcio Transrapid International AG (TRI), em Berlim, na Alemanha, para e comercializar o trem Maglev. Contudo, em 1999, uma mudança no governo alemão enfraqueceu o suporte político ao empreendimento da TRI, o que redundou no cancelamento, em fevereiro de 2000, da rota da Transrapid que ligaria Berlim a Hamburgo, isso a apenas seis meses da data prevista para o início das obras.[5]
Assim, no início de 2000, não havia nenhum trem de alta velocidade em operação no mundo que empregasse o Sistema Maglev. Exatamente naquele momento, o governo chinês enviou uma equipe de engenheiros à Alemanha para conhecer aquela tecnologia, resultando na celebração de um contrato com a TRI para construir uma linha de ligando o distrito financeiro da cidade de Xangai ao aeroporto de Pudong, numa distância de 30 km.
As obras começaram já em março de 2001 e, em 1º de janeiro de 2003, o Shangai Transrapid começou a operar comercialmente. Num curto trajeto de poucas dezenas de quilômetros, um trem dotado de poderosos imãs se ergue 10 mm sobre sua guia e, movido por outros magnetos, viaja a uma alta velocidade, atingindo um máximo de quase 320 km/h, completando o percurso em pouco mais de 7 minutos [6]. Para tal façanha, o governo chinês investiu US$ 1,2 bilhão, um investimento altíssimo considerando que o PIB da China na época situava-se ao redor de US$ 1.4 trilhão e o país ainda não iniciara a expansão vertiginosa que nas duas décadas seguintes o colocaria como a segunda economia do mundo.[7]
Figura 3 - Shangai Transrapid
Durante a construção do Shangai Transrapid, especulava-se que a experiência adquirida na sua operação comercial viabilizaria a construção de uma linha entre Xangai e Pequim utilizando trens Maglev de alta velocidade, num percurso de 1300 km e a um custo de £15.5 bilhões, ou aproximadamente US$ 20 bilhões. Esse empreendimento justificaria o alto investimento do governo chinês na obtenção daquela tecnologia, mas ele não foi adiante.[8]
Outra iniciativa se configurou em março de 2006, quando o governo chinês anunciou a construção do que seria a segunda linha comercial de trens Maglev no mundo, ligando Xangai à cidade de Hangzhou, num percurso de 175 km. Esperava-se que o trens Maglev, mais rápidos que os chamados trens-bala convencionais, alcançassem 430 km/h e o trajeto fosse cumprido em 27 minutos. O custo dessa obra estava estimado em US$ 4.5 bilhões.
Entretanto, já em junho de 2006, alguns sites de notícias chineses já alegavam que o projeto poderia ser abandonado se persistissem alguns alegados problemas relacionados a transferência de tecnologia para a construção daquela linha[9], e em março de 2008, o projeto foi abandonado.[10]
Ainda se especula sobre outros projetos de trens Maglev de alta velocidade na China, mas atualmente a única linha comercial de um trem Maglev naquele país é a do percurso de 30 km, ligando o centro financeiro de Xangai ao seu aeroporto e que custou US$ 1,2 bilhão. Diante de um investimento tão vultoso e com tão poucos resultados, alguém poderia dizer que o empreendimento foi um fracasso, mas há um acontecimento que merece ser conhecido.
Em 2017, a China surpreendeu os meios militares ao anunciar que seu segundo porta-aviões, ainda em construção, será dotado de catapultas eletromagnéticas, o que lhe permitirá operar com aeronaves mais pesadas, com maior raio de ação e poder de fogo. Certamente, essas novas capacidades não surgiram por acaso, mas isso já é assunto para outra história.
Referências
[1] Yadav et al, 2013.
[2] CHOPADE, 2017
[3] LEE et al. 2006.
[4] INCOSE, 2015.
[5] COATES, 2005.
[6] Idem
[7] Lista de países por PIB (nominal) passado e futuro - disponível em https://pt.wikipedia.org/wiki/Lista_de_pa%C3%ADses_por_PIB_(nominal)_passado_e_futuro#Estimativas_do_FMI_entre_2000_e_2009
[8] China claims train blue riband - disponivel em https://www.theguardian.com/world/2003/jan/01/china.johngittings, acessado em 20 de novembro de 2019.
[9] China May Abandon Shanghai-Hangzhou Maglev Line - Xinhua News Agency June 10, 2006, disponível em http://www.china.org.cn/english/2006/Jun/170954.htm, acessado em 20 de novembro de 2019.
[10] Shanghai-Hangzhou Maglev - disponível em https://www.railway-technology.com/projects/shanghai-Maglev/. Acessado em 20 de novembro de 2019o.
BIBLIOGRAFIA
CHOPADE, Shripad Shashikant. Magnetically Levitated Trains (Maglev). International Research Journal of Engineering and Technology. Vol 04, nº 04. 2017.
COATES, Kevin. Shanghai’s Maglev project – levitating beyond transportation theory. Enginerring World. Abril/Maio. 2005
INTERNATIONAL COUNCIL ON SYSTEMS ENGINEERING - INCOSE. Systems Engineering Handbook: a guide for system life cycle processes and activities. 4ª Edição. Hoboken, Estados Unidos da América: John Wiley & Sons, Inc., 2015.
LEE, Hyung-Woo; KIM, Ki-Chan; LEE, Ju. Review of Maglev Train Technologies. IEEE Transactions on Magnetics, Vol 42, nº 7. 2006.
YADAV, Monika; MEHTA, Nivritti; GUPTA, Aman; CHAUDHARY, Akshay; MAHINDRU, D.V. Review of Magnetic Levitation (Maglev): A Technology to Propel Vehicles with Magnets. Global Journal of Researches in Engineering Mechanical & Mechanics, Vol 13, nº 7. 2013
Nenhum comentário:
Postar um comentário