domingo, 14 de agosto de 2016

Sopro

Daqui a poucos dias passarei de coronel antigo a um simples e anônimo militar da reserva. Estou bem, tranqüilo e conformado, mas confesso que já estive bem mal. O pior já passou.

Ano passado, me sentia um promissor coronel quase general. Não me intimidavam a imensa responsabilidade, as dificuldades e tantas confusões que viriam daquela promoção. O que mais me valia era a satisfação do generalato, o  coroamento da minha bem sucedida carreira.

Nada disso se sucedeu e não fui coroado. Todos os cálculos e estimativas das minhas chances deram errado, os astros não se alinharam na minha constelação de amigos estrelados e não houve briga por mim no Alto Comando. Outros foram escolhidos, não eu.

Caí na realidade amarga e amarguei. Triste, magoado, decepcionado, testemunhei a promoção dos outros como um exército derrotado assiste perfilado ao desfile da vitória do inimigo. Foi duro, sofrido, doído, mas passou. Para dizer a verdade, não passou, mas vai passando.

Resta o que desta vida? Aposentadoria compulsória aos cinqüenta para que? 

Pedi para ser PTTC e aceitaram. Está quase tudo certo.  O general assinou a portaria, mas ainda falta publicar. Vão publicar, vão publicar, sim, eles têm que publicar. Pelamordedeus, publiquem!

É que eu preciso ter o que fazer. Sou muito capacitado, experimentado e ansioso para ficar em casa descansando da vida. Ainda quero me cansar muito, acreditem, gosto de trabalho.

Quero trabalhar, mas não num emprego qualquer. Não, não e não! Eu e só eu nesse Exército enxergo o mundo de oportunidades escondido nos HDs e gavetas da SLM4.

Esse mundo escondido tem milhares de armas, de veículos, de equipamentos de guerra. Tudo isso esperando estudos, requisitos, avaliações, decisões, manuais e relatórios. São como bichos de um planeta desabitado esperando que um Deus da burocracia lhes anime com um sopro de vida no rosto.

O ciclo de vida dos materiais está ali, naquelas gavetas. Eu e só eu sei onde buscá-lo. E estou ótimo de fôlego, pronto para soprar, soprar e assoprar.

Há tanto e tanto o que fazer que duvido que mais vinte anos serão suficientes para o tanto de sonho que me embala.

Sim, vinte anos, esse é o tempo que eu quero. Vinte anos para uma nova carreira, novos sonhos, novas realizações. E também quero que me soprem o rosto. Porque não?

Um comentário:

  1. Caro Ilha muitas vezes o plano de Deus nos surpreende, quanto a sua dedicação, amor a instituição e capacidade técnica impecável a construção diária de sua biografia fala por você o importante é manter o "sopro" da fornalha da paixão, essa que nos move. Que Deus o abençoe sempre e muito obrigado por continuar na construção dessa Instituição Exército Brasileiro que amamos e que é muito maior que a soma de todos nós. Soares Eng. 86....

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