domingo, 25 de outubro de 2015

Nova ordem mundial

Sabe uma diferença entre Rússia e EUA?
Os EUA ainda permanecem como um ator global e se procupam com o avanço chinês no Pacífico. 
Os russos não. Eles atuam fortemente nas áreas que consideram prioritárias, o que inclui o seu entorno europeu e o espaço sírio. Enquanto os chineses projetarem seu poder apenas no sentido do Pacífico sul, não ameaçarão a Rússia.
Nenhum país dispõe se recursos ilimitados e a vantagem tecnológica dos EUA é cada vez menor. Isso restringe as possibilidades dos americanos imporem sua vontade no espaço global. Eles dependem cada vez mais de parcerias regionais para amortizarem o choque de interesses.
Até outro dia, o mundo era bipolar. Aí, o muro caiu e parecia que apenas os EUA ditariam os destinos do mundo. A ascenção da China e as recentes demostrações de força de Putin mostram que a antiga bipolaridade virou  um jogo entre três potências. 
Os europeus, bem os europeus se ocupam muito pouco além do entorno de seu continente.
Russos, chineses e americanos vão perdendo força, mas ainda dominarão a cena geopolítica nos próximos anos.
Bem vindos à nova ordem mundial.

Blinder fechou sua coluna

Caio Blinder fechou sua coluna e eu levei um mês para saber disso. 
Que pena! Passei bem uns três anos frequentando os textos da coluna e participando da confraria de seus fieis comentaristas.
Estava sumido, por culpa da Jane's e da ciência e tecnologia, mas vez em quando passava por ali para saber o que os companheiros escreviam. E juntos, obtinhamos informações e consolidavamos nossas convicções.
Nunca foi  jogo de um lado só. Havia  embate de ideias, embora algumas vezes  com alguma deselegância.
Blinder fechou sua coluna e acho que deixei algum pedaço de mim dentro da sala. Quem sabe ele resolve usar suas chavea de sabedoria e reabrir portas e janelas?
Tomara.

Cerco ao Congresso

"Cerco ao Congresso", por Guilherme Fiuza

O Globo



Quem roubou não pode chamar o PT de ladrão, disse Luiz Inácio da Silva. Ou seja: ladrão que rouba ladrão tem cem anos de perdão, mas ladrão que xinga ladrão vai se ver com Lula. Até que enfim, uma medida moralizadora. O PT quer ser respeitado ao menos pelos bandidos — o que dentro da cadeia é uma coisa importante.

E por falar em bandido, roubo e cadeia, o delator Fernando Baiano disse que deu R$ 2 milhões do petrolão à nora de Lula. Enquanto isso, retorna à pátria (e à Papuda) Henrique Pizzolato, um dos heróis petistas do mensalão. As obras completas dos companheiros nestes 13 anos são realmente impressionantes. Se o governo do PT fosse um filme, seria o “Sindicato dos ladrões” — com todo o respeito. O mais curioso é como o Brasil se harmonizou bem com esse projeto criminoso de poder, na definição do ministro Celso de Mello (que não roubou, então pode dizer que o PT é ladrão).

Pizzolato esfaqueou o Banco do Brasil, Baiano esfolou a Petrobras — e esses são apenas dois agentes do maior sistema de corrupção da história, regido pelo PT de dentro do Palácio do Planalto. Agora tirem as crianças da sala para a notícia estarrecedora: o PT continua dentro do palácio.

Como escreveu Fernando Gabeira, o Brasil desmoralizou a instituição do batom na cueca. A mancha veio da lavanderia, o batom era progressista e a cueca era do bem. O ministro Gilmar Mendes disse que Dilma não precisa de um Fiat Elba como o de Collor para cair. Claro que não. Ela pode cair pedalando — o que seria inclusive menos poluente. As pedaladas fiscais que o TCU já condenou são crime de responsabilidade, e constituem uma fração do tal projeto criminoso — que não é feito só de mensalões e pixulecos, mas também de fraudes contábeis para maquiar o rombo.

Não deixem as crianças ouvirem: essa orgia companheira acaba de render ao Brasil o selo de país caloteiro. Agora sejam fortes: as pedaladas continuaram este ano, depois de flagradas e desmascaradas, e pelo menos uma das centrais de tramoias do petrolão continuou ativa depois da revelação do escândalo. Deu para entender? O PT é o cupim do Estado brasileiro, e não dá para pedir a ele: senhor cupim, por favor, poderia parar de devorar a mobília até 2018? O Brasil está esperando que os cupins passem a se alimentar de vento estocado e façam o ajuste fiscal.

Dilma Rousseff declarou na Finlândia que este governo não está envolvido com corrupção. É verdade.

A corrupção, coitada, é que está envolvida com este governo. De cabo a rabo. A Lava-Jato já apresentou as evidências de que a própria reeleição de Dilma se alimentou do petrolão — e Vaccari, o ex-tesoureiro do PT, está preso por causa disso. Mas o governo promete tapar o rombo, e lá estão os brasileiros com os braços estendidos para a seringa da nova CPMF, ou bolsa cupim. Contando, ninguém acredita.

Nesse meio tempo, num lugar muito distante da Finlândia, o Banco Central informa que desistiu de cumprir a meta fiscal. Note bem: não foi uma frase de Mercadante, Mantega ou outra das nossas autoridades de picadeiro. O Banco Central do Brasil, espremido entre a inflação e a recessão, teve que largar no chão a arma da política monetária: simplesmente não há o que fazer para respeitar a meta fiscal em 2016. Dilma reagiu: pediu à sua equipe econômica para flexibilizar a meta fiscal. Nessa linha, poderia aproveitar e pedir para flexibilizar o Código Penal. Seria mais eficaz neste momento.

O governo parou. Dilma, a representante legal (sic) do projeto criminoso de poder, está morando de favor no palácio. Conta com a blindagem do STF aparelhado, do companheiro procurador Janot e de um bando de inocentes úteis que doam suas reputações em troca de uma fantasia progressista cafona (alguns perderam a inocência na tabela dos pixulecos). Quem pode descupinizar o palácio é o Congresso Nacional. O pedido de impeachment está nas mãos do presidente da Câmara, que um Brasil abobado transformou em inimigo público número um — porque aqui quem assalta com estrelinha no peito é herói. Eduardo Cunha pode ser cassado, condenado ou execrado, só não pode roubar a cena daqueles que roubaram o país inteiro.

Os brasileiros que estão autorizados por Lula a chamar o PT de ladrão estão chegando a Brasília, acampando em frente ao Congresso Nacional. Quando deputados e senadores estiverem devidamente cercados pela multidão, brotará num passe de mágica sua responsabilidade cívica. Aí os nobres representantes do povo farão, altivamente, a descupinização do palácio — sem traumas, em nome da lei. O resto é com a polícia.

domingo, 13 de setembro de 2015

"Lula e sua turma agem sem remorsos", por Ferreira Gullar

DOMINGO, 13 DE SETEMBRO DE 2015

"Lula e sua turma agem sem remorsos", por Ferreira Gullar

Folha de São Paulo


O fim do caminho


Escrevi, certa vez, que a geração ideológica que havia combatido a ditadura e que assumiu o poder no Brasil após o regime militar chegava ao seu fim, isto é, cumprira a sua função e se esgotava.

O grupo liderado por Fernando Henrique Cardoso, de uma esquerda moderada, governou até 2002, quando Luiz Inácio da Silva ganhou as eleições e, com isso, a facção mais radical daquela geração assumiu o governo e nele se manteve até agora, no segundo mandato de Dilma Rousseff. Essa é uma geração que, em diferentes graus, situava-se à esquerda dos que apoiaram a ditadura e se aliou, consequentemente, aos partidos que pregavam o marxismo, embora não fosse aquele seu pensamento.

Nesse quadro, nasceu o Partido dos Trabalhadores, liderado por um operário e formado por simpatizantes da Revolução Cubana. Mas os grupos guerrilheiros foram destroçados, e o sistema soviético em seguida desabou.

Desse modo, quando o PT chegou ao poder, as fantasias revolucionárias já estavam fora de moda. Além disso, os escândalos do mensalão e, agora, as delações da Operação Lava Jato revelaram que, se Lula e seu pessoal foram de fato revolucionários algum dia, ao chegarem ao poder mudaram de projeto.

Imagino o que se passou na mente dos petistas: se a postura revolucionária não tinha mais cabimento, que fazer com o poder que lhes caíra no colo? Antes de tudo, não deixar que viesse a escapar-lhe das mãos e, para consegui-lo, a providência fundamental era manter e ampliar o apoio do eleitorado pobre.

Isso, por um lado; por outro, não dividir com ninguém os cargos importantes da máquina do Estado, como os ministérios e as grandes empresas estatais. Aliou-se, então, aos pequenos partidos, aos quais, em vez de dar altos cargos, comprou com dinheiro público: o mensalão.

Tendo nas mãos os ministérios e as estatais, infiltrou-os com a nomeação de mais de 20 mil "companheiros", sem concurso, a fim de que cedessem parte do salário ao partido e trabalhassem pela ampliação do número de novos militantes a favor do governo.

Mas isso não era tudo. O principal residia na apropriação das grandes empresas do Estado e particularmente da maior delas –a Petrobras. Ficou comprovado, na Operação Lava Jato, que, desde 2003– quando Lula assumiu o governo–, criou-se na Petrobras um "clube", formado por altos funcionários, ligados aos partidos do governo, e representantes de grandes empreiteiras, que prestavam serviço à empresa. As licitações –que envolviam centenas de milhões de reais– eram manipuladas de modo que, em rodízio, cada uma daquelas empresas obtivesse os contratos.

O custo das obras era então duplicado e as propinas distribuídas aos partidos e participantes das falcatruas, disso resultando, para a Petrobras, prejuízos bilionários, por ela mesmo admitidos.

A tais prejuízos somam-se os resultantes de negociatas envolvendo a compra e a construção de refinarias. E era Lula quem acusava seus opositores de pretenderem privatizar a Petrobras. Ele, de fato, não a privatizou: apropriou-se dela.

Lula e sua turma agem sem remorsos, uma vez que, sendo eles os defensores dos verdadeiros interesses nacionais, julgam-se com o direito de se apropriarem dos bens públicos.

Vou dar um exemplo. Há algum tempo, antes da Lava Jato, uma senadora do PT, indagada sobre os crescentes prejuízos sofridos pela Petrobras, respondeu: "Só quem se preocupa com isso são os acionistas. A Petrobras existe para servir ao povo".

Ou seja, não tem de dar lucro. Agora, a Operação Lava Jato mostrou que a sua eleição ao Senado, em 2014, foi financiada com propinas da Petrobras e, assim, dá para entender a sua tese: a senadora é o povo.

Esse é um tipo de populismo que, se arvorando defensor dos pobres, atribui-se o direito de usar de qualquer meio, inclusive a corrupção, para manter-se no poder.

Lula e Dilma só não contaram com duas coisas: que a gastança demagógica levaria o país à crise econômica e que suas falcatruas seriam reveladas à opinião pública.

O engodo se desfez, a credibilidade dos petistas despencou. Qual será o desfecho dessa comédia não sei dizer, mas que o lulopetismo já não engana a quase ninguém, não resta dúvida.

sábado, 5 de setembro de 2015

Botes de refugiados

No início do ano, os europeus se indignaram com o ataque ao Charlie Hebdo e muitos no velho continente demonstraram sua contrariedade com a comunidade islâmica, de onde vieram os assassinos dos cartunistas.
Agora, a imagem do menininho morto numa praia turca provoca o efeito oposto e há quem saia às ruas exigindo que seus governos acolham os milhares de refugiados da guerra síria. Às vezes, a opinião pública europeia flutua ao sabor das ondas de um Mediterrâneo em noite de tempestade.
Acontece que muitos outros menininhos sírios morreram e morrem na guerra civil em seu país e os maiores culpados disso não são os líderes europeus, o Obama ou mesmo o Putin. Entendo quem se comova com o triste corpinho de criança na praia turca, mas também compreendo quem não queira arcar com os custos de uma guerra que não é sua.
Há tempos que a primavera árabe de Damasco se transformou num inferno. Agora, como encanto, os botes lotados de fugitivos levam a crise humanitária para as praias do norte do Mediterrâneo e reforçam o ceticismo sobre a própria viabilidade da União Europeia.

sábado, 29 de agosto de 2015

Pixulequeiros

O J R Guzzo escreveu em sua coluna de hoje, e eu concordo, que o Brasil pode ganhar muito mais do que vem perdendo nessa crise. Para isso, será preciso mudar velhos maus hábitos tolerados por nossa sociedade, que vão desde a troca de favores a funcionários públicos que ganham sem trabalhar, passando por pixulecos e muita propina.
A redução do ritmo de crescimento da China é apenas uma desculpa esfarrapada para explicar a crise brasileira, que é muito mais política do que econômica. 
Evidentemente, o governo é o responsável por essa encrenca, mas tem muito mais gente engrossando o coro dos culpados. A começar pelo PT, passando pela imprensa e seus jornalistas engajados, como nos cansamos de ver, ler e ouvir na Folha de São Paulo, no O Globo, na Globonews, no UOL e em tantos outros Jô Soares da televisão. A conta dos pixulequeiros vai aumentando e explode quando finalmente alcança o maior culpado de todos: o povo que vota no PT. 
Há quem se venda por lucros nos negócios; outros por patrocínios em suas peças de teatro; e muitos por uma boquinha no governo, um favorzinho aqui, outro acolá.
A crise não é ruim, não. Ela é boa. Boa porque bota este país a limpo. Agora, que todos vemos a sujeira, é que devemos ter a coragem de limpar a casa e botar os ratos para fora.


quinta-feira, 16 de julho de 2015

Idiotices da esquerda


Para aqueles que ainda têm alguma dúvida, seguem abaixo 21 exemplos clássicos da inconsistência intelectual presente nas ideias da imensa maioria dos esquerdistas, ressalvando que esta relação não é, de forma nenhuma, exaustiva (contribuições à lista serão bem vindas):
  1. Esquerdistas em geral acreditam piamente no chamado “consenso científico” a respeito do aquecimento global antropogênico e das mudanças climáticas, mas se recusam a levar em conta o mesmo “consenso” sobre a salubridade dos alimentos geneticamente modificados.
  2. Esquerdistas em geral são a favor da liberdade de escolha da mulher em relação ao aborto, mas querem reduzir essa mesma liberdade quanto à escolha da forma de parto e, não raro, pregam que o governo interfira no mercado para limitar o número de cesáreas, que, segundo alguns especialistas, poderiam prejudicar o bebê.  Tão preocupados com a saúde dos fetos e tão indiferentes à sua vida.
  3. Esquerdistas em geral são intransigentes defensores dos direitos da mulher e da igualdade de gênero nos países ocidentais, mas costumam fazer vista grossa ao que acontece com elas nos países islâmicos, onde muitas vezes são tratadas como escravas, privadas dos direitos individuais mais elementares.
  4. Esquerdistas em geral, acertadamente, acreditam que aumentos de preços, via impostos, incentivam a redução do consumo de cigarros, gorduras e açúcares, mas acham que aumentos no salário mínimo não terão qualquer conseqüência no consumo da mão de obra pouco qualificada.  Para eles, a lei econômica da oferta e da demanda é opcional.
  5. Esquerdistas em geral favorecem a liberação da maconha e de outras drogas, em nome da liberdade individual de escolha, mas estão engajados em verdadeiras “jihads” contra o cigarro, as guloseimas, os refrigerantes e as gorduras trans. Ou seja, a liberdade de escolha depende da substância e não do discernimento do consumidor.
  6. Esquerdistas em geral consideram que as mulheres estão sub-representadas em diversas áreas da sociedade, como no Congresso Nacional e nos altos cargos de direção empresarial, e não raro defendem a implantação de políticas afirmativas (cotas) para “solucionar” o “problema”.  Porém, não ligam a mínima que o mesmo aconteça nas prisões e nas profissões de alto risco, por exemplo, onde o número de homens é também muito maior que o de mulheres.
  7. Esquerdistas em geral são defensores intransigentes da ecologia e da vida animal, a ponto de promoverem verdadeiros linchamentos públicos sempre que alguma empresa petrolífera é responsável por vazamentos de óleo, mas fecham os olhos ao intenso massacre de pássaros promovido, por exemplo, pelas hélices geradoras de energia eólica e pelas fazendas de energia solar, não por acaso as formas de energia de seus sonhos.
  8. Esquerdistas em geral consideram que os menores de 18 anos – e maiores de 16 – estão aptos a votar, formar sociedades empresariais, ter vida sexual ativa e até mesmo dirigir automóveis, mas são ao mesmo tempo absolutamente imaturos e incapazes de assumir eventuais responsabilidades por seus delitos.
  9. Esquerdistas em geral deram apoio solidário e irrestrito à decisão da maioria no plebiscito grego sobre a dívida pública daquele país, mas se recusam a aceitar o resultado do plebiscito brasileiro sobre o desarmamento. O importante não é a democracia, mas o resultado do pleito.
  10. Esquerdistas (pelo menos alguns) concordam que a carga tributária brasileira é alta e acham que deveria baixar, mas não pensam duas vezes na hora de apoiar qualquer nova política pública que aumente os gastos do governo.
  11. Esquerdistas em geral são ferozes opositores do famigerado “consumismo desenfreado” praticado nas sociedades capitalistas, entretanto são os primeiros a propor políticas de incentivo que visem ao aumento do consumo, em períodos recessivos.  Nessas horas, alguns chegam a apontar a poupança como ação antipatriótica.
  12. Esquerdistas em geral costumam vituperar contra os altos salários dos executivos (vide o Movimento Occupy Wall Street), mas se calam diante dos altíssimos salários de seus artistas e desportistas prediletos, os quais, muitas vezes, ganham tanto ou mais do que aqueles.
  13. Esquerdistas em geral reclamam dos altos preços dos produtos e serviços cobrados pelos gananciosos empresários capitalistas, ao mesmo tempo em que defendem, sistematicamente, o protecionismo mercantil, que reduz a concorrência e, consequentemente, ajuda a manter elevados os preços.
  14. Esquerdistas em geral reclamam da corrupção, mas nunca desistem de querer aumentar o poder e o dinheiro nas mãos dos governos. Privatização? Nem pensar!
  15. Esquerdistas em geral defendem, com justíssima razão, os direitos dos homossexuais, embora venerem alguns de seus maiores algozes, como Che Guevara e Fidel Castro, dois símbolos da perseguição contra os gays.
  16. Esquerdistas em geral acham que a liberdade de expressão deve ser restringida quando, por exemplo, ela agride a imagem do Profeta Maomé, mas não estão nem aí para as agressões contra símbolos cristãos ou judeus.
  17. Esquerdistas em geral foram às ruas e levantaram bandeiras a favor do impeachment constitucional de Collor, assim como passaram anos pedindo o impeachment de FHC, mas acusam de golpistas os que hoje pedem o impeachment de Dilma.
  18. Esquerdistas em geral discursam contra os grandes conglomerados empresariais das economias capitalistas, mas não se cansam de apoiar políticas públicas de apoio às grandes empresas, não raro fomentadoras de monopólios e oligopólios, como as praticadas, por exemplo, pelo BNDES.
  19. Esquerdistas em geral são favoráveis à quebra de patentes farmacêuticas e, em muitos casos, até à sua completa extinção, mas costumam defender como intocáveis os direitos autorais de seus escritores e artistas preferidos.
  20. Esquerdistas em geral, em época de eleição, costumam elevar os eleitores à condição de sábios (especialmente quando votam majoritariamente neles), mas tratam esse mesmo eleitor como alguém totalmente incapaz de tomar as decisões mais comezinhas do dia-a-dia, devendo ser tutelado até mesmo a respeito do que comer, beber, ler ou assistir.
  21. Esquerdistas em geral almejam viver numa sociedade sem distinção de classes ou raças, mas não raro são os primeiros a dividi-la de acordo com a classe social ou a cor da pele. Quantas vezes, você, amigo liberal, já foi chamado de “coxinha”, “burguês”, “branquelo” e outras alcunhas do gênero?

terça-feira, 14 de julho de 2015

Por que vocês não desistem, comunas?

TERÇA-FEIRA, 14 DE JULHO DE 2015

Por que vocês não desistem, comunas?

Com Blog Rodrigo Constantino - Veja



Gosto quando Arnaldo Jabor traz à tona as reminiscências de sua juventude utópica e comunista. São seus melhores textos, ao contrário de quando resolve falar da política americana, quando ainda deixa transparecer o ranço ideológico dessa época, ao elogiar os Democratas esquerdistas e demonizar a direita Republicana. Em sua coluna de hoje, Jabor foi preciso ao retratar a insistência dogmática dos comunas no erro: são incapazes de aprender com eles, e a cada nova experiência fracassada, concluem que é preciso redobrar os esforços na mesma direção. Há definição melhor de estupidez?
A chegada dos velhos comunas ao poder expôs o vácuo de ideias dessa turma, assim como sua incapacidade administrativa. Se antes a esquerda era romântica e utópica, hoje passou a ser apenas cínica, defendendo o banditismo, o lulopetismo, em troca de cargos ou esmolas. Como Jabor reconhece, o romantismo de antanho era “meio babaca”, mas era a única forma que essa gente tinha para enxergar o mundo na época da Guerra Fria.
Claro, não é exatamente verdade isso, pois mesmo naquele contexto não foram poucos os que viram o embuste do socialismo revolucionário, e em vez de terem orgasmos com a chegada dos barbudos ao poder em Cuba, tiveram calafrios. Mas, naturalmente, havia um atenuante para quem se encantou com a alternativa socialista antes de todos os seus fracassos se tornarem públicos e notórios. Hoje, qual a desculpa? Como alguém ainda consegue defender o socialismo? A tentativa de monopolizar as virtudes continua sendo uma das principais explicações, como reconhece o próprio Jabor:
Nós éramos mais “puros”, mais poéticos, mais heroicos que os meus colegas de PUC, todos já de gravatinhas adultas. Como era bom se sentir acima dos outros, não por competência ou cultura, mas por superioridade ética. Os operários eram nossa meta existencial. Para nós eles eram o futuro da Humanidade. Nas oficinas do jornal estudantil que eu fazia, crivavam-nos de perguntas e agrados, sendo que os ditos operários ficavam desconfiados e pensavam que nós éramos veados e não fervorosos “revolucionários”.
Naquele tempo não era possível pensar de outro jeito. De Sartre a Brizola, não havia outra ideologia disponível. A guerra fria dividia o mundo em duas facções, e a tomada do poder de Fidel Castro inebriou nossos desejos. Mesmo delirando em utopias, queríamos verdadeiramente, romanticamente salvar o país, contra o “imperialismo americano, o latifúndio e a direita espoliadora”. Não havia espaço para outras ideias, e quem ousasse pensar diferente era canalha, lacaio dos americanos. Por exemplo, Raymond Aron era de “direita” porque discordou do Sartre, pois esse incitava seus leitores para agir; Aron ensinava-os a pensar. Como acreditávamos nessa dualidade, ela virou uma verdade incontestável. E essas “verdades” criaram uma nova linguagem que praticávamos com fé e determinação. Em vez dos fatos, a linguagem bastava e nos movia. A linguagem ignorava o mundo real, chato e complexo demais para a mutação histórica que faríamos pois, afinal, éramos os “sujeitos da história”. Só as palavras simplistas explicavam nossa visão de mundo: alienação, massa atrasada, massa avançada, conscientização, sectarismo, aventureirismo, reacionarismo, entreguismo, proletariado, democracia burguesa e a palavra sagrada que tudo justificava: o “povo”.
Eis aí uma bela definição do que ainda move muito comuna: eles desejam se sentir superiores, só por serem de esquerda. Eles acham que entenderam melhor o mundo, em vez dos “alienados” da classe média, os burgueses, pois eles têm mais “consciência política”. Eles estão do lado “certo” da História, pois condenam as “injustiças” do mundo capitalista, a ganância (dos outros), o lucro (dos outros), e resumem tudo a um simplismo dicotômico pra lá de infantil: os virtuosos de esquerda, e os malvados capitalistas. Como é simples e confortante essa visão de mundo! Esses “intelectuais” estão em contato pleno com o “povo”, enquanto abstração. É uma droga poderosa, um entorpecente e tanto.
O que espanta Jabor, que foi um deles, é sua incapacidade de mudança, de aprender com os próprios erros. Isso também sempre me espantou, apesar de jamais ter sido de esquerda. Como pode esse pessoal repetir a mesma ladainha meio século depois, como se nada tivesse acontecido nesse período que derrubasse cada bandeira socialista? Como alguém pode defender Cuba hoje? Como alguém pode manter o mesmo discurso idiota contra o capitalismo, o lucro, a ganância, o “imperialismo ianque”? “Eles não mudam nunca”, desabafa Jabor. Persistem na mesma marcha da insensatez. Jabor conclui, usando um grande pensador brasileiro:
Nunca me esqueço de um debate do grande intelectual “aroniano” José Guilherme Merquior com dois marxistas na TV. Os dois falavam sempre dos erros da esquerda, mas considerados apenas como “percalços” de uma marcha triunfal para o futuro. Eles diziam, batendo no peito: “Erramos no stalinismo, na Hungria, em Praga, aqui erramos em 1935, 1964, em 1968, mas continuaremos lutando.” Merquior respondeu na lata: “Por que vocês não desistem?”
Uma boa pergunta: por que vocês não desistem? Talvez a resposta seja dura: porque não conseguem ser diferentes, por falta de inteligência, ou de caráter. Porque necessitam desse ópio como um viciado necessita da pedra de crack. Porque sem esses dogmas, eles se sentem totalmente desamparados. Porque são covardes. Porque são muito vaidosos e amam a autoimagem de “altruístas” refletida no espelho quebrado de suas casas. Porque são oportunistas. Porque são burros mesmo. Enfim, temos algumas alternativas, mas a pergunta permanece: por que vocês não desistem, comunas?

Nenhum comentário:

sábado, 4 de julho de 2015

A extinção da mulher sapiens", por Guilherme Fiuza

"A extinção da mulher sapiens", por Guilherme Fiuza

O Globo


Pela teoria de domínio do fato, Lula e Dilma estariam sendo investigados. Procura-se um homo sapiens capaz de fazer isso acontecer

Dilma chegou lá. Conseguiu enfim bater a popularidade de Collor na época do impeachment. Alcançou um dígito de aprovação (9%), segundo o Ibope, e 68% de rejeição. A façanha se deu logo após a confissão de Ricardo Pessoa, o homem-bomba das empreiteiras. Ele confirmou que financiou a campanha de Dilma em 2014 com dinheiro roubado da Petrobras. É o flagrante definitivo do nacionalismo companheiro. O que faz uma mulher sapiens diante de tal obscenidade?
Faz o de sempre: joga areia nos olhos da plateia, como diagnosticou Fernando Gabeira. Mas a tática de embaralhar e confundir, quando utilizada por uma pessoa embaralhada e confusa, produz um resultado esquisito. “Não confio em delator”, rebateu Dilma, atirando no mensageiro. A presidente explicou que a ditadura tentou fazê-la delatar seus companheiros, e ela não aceitou. Até Joaquim Barbosa surgiu de seu exílio para dizer que Dilma feriu o instituto da delação premiada com esse paralelo estapafúrdio. Mas Joaquim não entende nada da lógica companheira.
Lula da Silva já justificou massacres impostos pelo seu amigo ditador do Irã como “briga normal entre flamenguistas e vascaínos”. Agora ele admitiu que Dilma mentiu na eleição, conforme revelou o GLOBO, ao dizer que ajuste fiscal era coisa do seu adversário. Mas durante a campanha, quando o adversário denunciava as mentiras de Dilma — o ajuste de Armínio Fraga ia esvaziar o prato do povo —, a infantaria petista gritava que era agressão contra a mulher. Mulher sapiens, vítima da ditadura, coitada profissional. Haja areia.
A Operação Lava-Jato, que não deixa em paz esse governo sofrido e discriminado, prendeu donos de empreiteiras. Entre eles o presidente da Odebrecht, cujo lobista levou Lula para passear pelo mundo. As prisões foram feitas sob a teoria de domínio do fato, isto é, autoria indireta dos crimes. Ricardo Pessoa, Paulo Roberto Costa e Alberto Youssef já inundaram o processo do petrolão com evidências de que o esquema prosperou à sombra do Palácio do Planalto. Pela teoria de domínio do fato, Lula e Dilma estariam no centro das investigações. Procura-se um homo sapiens capaz de fazer isso acontecer.
Aí vem o Tribunal de Contas da União mandar a presidente justificar as pedaladas fiscais. Só pode ser uma conspiração da direita. Como a orgia nas contas públicas não é justificável, a plateia aguarda com a respiração presa o próximo truque para livrar Dilma do crime de responsabilidade. Cuidado com os olhos, porque lá vem areia. Já mandaram o ex-secretário do Tesouro dizer que a culpa foi dele — mais um aloprado desses que fazem o diabo por conta própria e não obedecem a ninguém. Como não há estoque de álibis que chegue para tanta fraude, o governo do PT está por um fio.
E quem segura esse fio é um elenco admirável. Há jornalistas importantes (com e sem mesada), intelectuais respeitáveis, expoentes da cultura. Eles formam a tropa de choque da Dilma — mais ou menos como aquela liderada por Roberto Jefferson na via crúcis de Collor. Esses bem-pensantes não se importam com o estelionato petista, que em nome da justiça social depenou o país, porque estão com os olhos enfiados na Bíblia. Luiz Inácio é seu pastor e nada lhe faltará (se cortejares o partido certo). Se vires milhões nas ruas contra a impostura do PT, enxergarás apenas a faixa pedindo intervenção militar — e gritarás contra a “onda conservadora”. Caminhando e cantando e seguindo o cifrão.
Evidentemente chegará o dia em que esses dogmas de 1,99 vão se esfarelar, e a mulher sapiens irá para o museu de história natural. Nesse dia, os gladiadores progressistas da Dilma dormirão como heróis dos oprimidos raciais, sociais e sexuais, e acordarão como avalistas da maior picaretagem do Brasil contemporâneo. Gente, é sério: isso vai dar uma ressaca danada.
Lula foi fazer comício para os petroleiros e gritou (quanto menos ouvem, mais ele grita) contra a perseguição “das esquerdas”. Ele está falando com vocês, seguidores do livro sagrado dos maniqueísmos. O povo não está nem aí para esse papo de esquerda. O que o povo sabe é que o emprego está indo embora e a inflação está voltando, por obra de um governo que destruiu as finanças públicas com sua gana parasitária. Isso é ser de esquerda? Resolvam aí entre vocês, antes que seja tarde.
A explicação do governo bonzinho para as doações confessadas pelos presos da Lava-Jato é que tudo foi recebido de maneira absolutamente legal. Ou seja: o dinheiro era sujo enquanto era propina, mas ao entrar legalmente no caixa do PT ficou limpinho. Como resumiu Renata Lo Prete: no mensalão, a estratégia petista era alegar caixa dois; no petrolão, a estratégia é alegar caixa um.
Quem pode acreditar que essa má fé compulsiva provém de um projeto humanitário de poder? Atualizem logo o seu selo de bondade, prezados cidadãos conscientes. Largar a mão da mulher sapiens quando ela estiver sendo varrida pelo dilúvio não vai pegar bem.

domingo, 21 de junho de 2015

A frente socialista dos palestrantes milionários

"A frente socialista dos palestrantes milionários", por Guilherme Fiuza
Epoca

A Petrobras é uma mãe, e se você não está na ninhada é porque não se filiou ao partido certo


Enquanto a Polícia Federal descobre R$ 4,5 milhões pagos por uma empreiteira a Lula, o PT lança a candidatura presidencial do filho do Brasil com uma “guinada à esquerda”. Coerência total: o dinheiro da empreiteira, segundo o Instituto Lula, era para “erradicar a pobreza e a fome no mundo”. É um projeto ambicioso, mas pode-se dizer que já está dando resultado, com a erradicação da fome da esquerda por verbas e cargos. Uma fome de cada vez.

O discurso preparado pelo PT para seu Congresso em Salvador inicia a arrancada para dar ao Brasil o que ele merece: a volta de Lula da Silva em 2018. Com sua consciência social e convicção progressista, o Partido dos Trabalhadores salta na trincheira contra o neoliberalismo, assumindo sua vocação de governo de oposição – o único no mundo. O truque é simples, e vai colar de novo: a vida piorou e o desemprego voltou por causa “da crise global do capitalismo”, esse monstro que infiltrou Joaquim Levy no governo popular. Lula voltará à Presidência para enxotar novamente essa maldição capitalista (bancado pelo socialismo das empreiteiras amigas).

O gigante se remexe na cama, mas a armação dos companheiros definitivamente não atrapalha seu sono. ÉPOCA mostrou o ex-operário trabalhando duro pelo sucesso internacional da Odebrecht, a campeã de financiamentos externos do BNDES. Revelou que oMinistério Público investiga o ex-presidente por tráfico de influência. Vem a Polícia Federal e flagra as planilhas da Camargo Corrêa, investigada na Operação Lava Jato, com uma média anual superior a R$ 1 milhão em transferências para Lula (Instituto e empresa de palestras) desde que ele deixou a Presidência. E o gigante ronca.

O Brasil não se incomoda com a dinheirama entregue a Lula. É uma ajudinha ao grande líder para que ele combata a pobreza no planeta, qual o problema? Nenhum. A não ser para essa elite branca invejosa, que acha estranho o dinheiro vir de empreiteiras que têm como cliente o governo no qual Lula manda.

Os petistas, como se sabe, são exímios palestrantes e consultores. Destacam-se nessa arte estrelas como o governador de Minas Gerais, Fernando Pimentel, e o ex-ministro Antonio Palocci, ambos consagrados por suas consultorias mediúnicas milionárias. Lula deve ter passado seus oito anos no Palácio do Planalto treinando duro, porque saiu de lá em ponto de bala. Não é qualquer um que chega a Moçambique, faz uma palestra e embolsa R$ 815 mil – pagos à vista por uma empreiteira brasileira. Deve ser isso o paraíso socialista: empresários pagando fortunas a iluminados por palestras em outro continente, para a construção de um mundo melhor.

Assim fica fácil salvar o Brasil da crise global do capitalismo, conforme a plataforma do PT no seu 5º Congresso Nacional. Com a assinatura da delação premiada de Júlio Faerman, ex-representante da empresa holandesa SBM, os brasileiros entenderão ainda melhor como o capital internacional elitista e malvado escorre docemente para o bolso dos defensores do povo – através das fantásticas operações socialistas envolvendo a maior estatal do país. A Petrobras é uma mãe – e se você não está na ninhada é porque não se filiou ao partido certo.

A inflação bate 8,5%, e o milagre brasileiro (da miopia) permite que a presidente da República assegure, tranquilamente, o respeito à meta – que é de 4,5%. Quem quiser chamá-la de mentirosa assegurando o respeito ao que ela diz, portanto, estará dentro da margem de erro. Mas ninguém fará isso, porque o Brasil adormeceu de novo, em bloco. A recessão iminente, a escalada do desemprego e o consequente aumento da violência urbana – com tiros e facadas democraticamente distribuídos nas capitais do país – são problemas que a nova Frente Popular vai resolver em 2018, com Lula lá. Duvida? Então procure saber o tamanho do caixa que a frente de palestrantes e consultores formou nos últimos 12 anos, com o mais sórdido dos cúmplices: a opinião pública brasileira.

A reeleição de Lula após o mensalão permitiu a ascensão de Dilma. A reeleição de Dilma após o petrolão permitirá a volta de Lula. A divertida gangorra prova que o crime compensa. A não ser que... Melhor não falar, para não perturbar o sono do gigante.

 

sábado, 20 de junho de 2015

Venezuela triste

O Estadão publicou ontem a irritação da presidente com a viagem dos senadores à Venezuela. Não, ela disse, não devemos nos intrometer nos assuntos internos dos nossos vizinhos, ainda mais na Venezuela, prosseguiu, tão profundamente dividida.
A presidente poderia estar coberta de razão, mas não está. O território venezuelano está ali, encaixado no norte do Brasil, e não sairá de lá a não ser que haja uma nova acomodação geográfica do planeta, daquelas que separam continentes  e fragmentam as linhas imaginárias que marcam os limites geográficos dos países.
Recheando o vasto território vizinho, está o povo venezuelano, nossos vizinhos que ainda se mantêm unidos, embora, como nossa própria presidente reconheceu, profundamente divididos.
A última eleição presidencial naquele país deu o grau dessa divisão. Em grosso modo, cinquenta porcento de um lado, cinquenta porcento do outro.
O país de cima é metade mais metade e o governo que o desgoverna representa, se muito, apenas um dos lados opostos, embora imponha sua vontade a todos.
O erro da presidente é confundir o governo de Maduro com a própria Venezuela, e ele não é. O compromisso do Brasil é respeitar o país vizinho, o que é muito diferente de aceitar que seus governantes matem manifestantes nas ruas e encarcere oposicionistas sem julgamento ou sequer indiciamento.
Meu maior medo hoje é a metade armada da Venezuela resolver prender, amputar, matar a outra, desarmada. Será que teremos então que ficar calados e continuar não nos metendo nos problemas internos dos nossos vizinhos?

sábado, 13 de junho de 2015

Ronald Reagan

Reagan trabalhou atuando em filmes em Hollywood, mas em nenhum de seus papeis alcançou a grandeza de sua marca na História. Uma das mais marcantes personagens do século XX não foi o ator, mas o político.
Aos 70 anos, chegou já bem rodado na presidência. Vivera os tempos de uma grande guerra, o glamour das câmeras de cinema, foi diretor de um sindicato de atores, executivo de uma grande empresa, governador da Califórnia, expoente de um partido político.
Um ano como presidente e Reagan sofre um atentado a bala, que poderia ter lhe encurtado a vida. Saiu do hospital e nos anos seguintes comandou o fim da guerra fria a bordo da cadeira mais importante do mundo.
Este foi o seu maior feito, ao redor do qual orbitam todas suas virtudes e fraquezas.
Ao lembrar de Reagan, pensamos no ator-presidente, o que ofusca sua característica mais importante: o pragmatismo. E foi um hábil negociador, um homem com suas convicções bem arraigadas, mas que buscava sempre a convergência. 
Foi um conservador? Era de direita? Sim, e daí? 
Daí que Reagan nos mostrou que a Política com P maiúsculo é o caminho para melhorar a sociedade. Não só isso, mas principalmente isso.
Ele nos deixou em 2004. Um homem desses faz falta.

sábado, 23 de maio de 2015

Nova guerra fria

Dois anos atrás, o parlamento britânico negou autorização ao primeiro-ministro para intervir militarmente na Síria. Pouco depois, Obama e Putin negociaram um acordo que levou Assad a assinar a Convenção para a Proibição de Armas Químicas, livrando suas forças de bombardeios norte americanos em retaliação ao emprego de Sarin por tropas sírias, o que causou a morte de várias centenas de civis e crianças.
Na época, muitos, inclusive eu mesmo, identificaram falta de disposição dos EUA em punir os responsáveis pela atrocidade.
Os parlamentares britânicos e o presidente dos EUA perceberam os limites de seu poder e evitaram que seus países mergulhassem em um novo conflito, dessa vez num caldeirão de pólvora chamado Síria, onde a luta envolve muito mais do que choque de religiões ou de interesses geopolíticos.
Putin enxergou a fraqueza da OTAN e abocanhou a Crimeia poucos meses depois. 
O conflito na Ucrânia continua sem solução. Na Síria também e o Estado Islâmico permanece ativo e avançando. Tudo isso está interligado.
Estamos no meio de um impasse, onde os atores do jogo internacional não têm força ou interesse suficiente para derrubar seus adversários.
É uma outra modalidade de guerra fria.

sexta-feira, 15 de maio de 2015

A visita de Li Keqiang ao Brasil - SERGIO AMARAL


A visita de Li Keqiang ao Brasil - SERGIO AMARAL
O ESTADÃO - 15/05

Em julho de 2014, o presidente da China, Xi Jinping, visitou o Brasil, acompanhado por uma delegação de vários ministros e mais de 200 empresários. Menos de um ano depois, será a vez do seu primeiro-ministro, Li Keqiang, desembarcar em Brasília, em 18 de maio próximo, à frente de uma missão empresarial integrada por altos dirigentes de algumas das mais destacadas empresas chinesas. Essas duas visitas, por si só, atestam a relevância que a China atribui ao Brasil.

Há sólidas razões para tanto. Primeiro, a economia.

Em pouco mais de uma década, o comércio entre os dois países cresceu quase 20 vezes. Os investimentos diversificaram-se e alcançaram cerca de US$ 28 bilhões.

Agora, a crise econômica e a Operação Lava Jato criaram uma oportunidade para empresas chinesas. Algumas das grandes construtoras brasileiras limitarão suas operações num mercado, o das grandes obras públicas, que até há pouco dominavam. A retração dos financiamentos, por sua vez, poderá induzir a flexibilização das regras de conteúdo nacional para a aquisição de equipamentos. Amplia-se, assim, o espaço para a participação de investidores estrangeiros nas novas concessões para projetos de infraestrutura. Nesse contexto, o investidor chinês encontra-se em posição privilegiada, pois é competitivo na tecnologia, nos equipamentos e no financiamento.

Mas o vigor da relação Brasil-China não se restringe à economia. Está também na política, sobretudo no momento em que a China dá passos firmes para consolidar sua presença e sua influência em escala mundial. Primeiro, pela busca de maior participação nas instâncias de decisão da governança internacional, especialmente nos organismos financeiros. A revisão na ponderação de votos nas instituições de Bretton Woods, no entanto, depois de anos de negociação, não foi ainda ratificada pelo Congresso norte-americano, o que levou o governo de Beijing a estimular a criação de instituições espelho, como o Banco de Desenvolvimento dos Brics e o Banco Asiático de Investimento em Infraestrutura. Sem falar na conclusão de dezenas de acordos para a troca de moedas, para facilitar o comércio em moedas locais e preparar o caminho para a internacionalização do yuan.

A ofensiva chinesa no campo dos investimentos externos, estimados em US$ 1,25 trilhão para a próxima década, em várias regiões do mundo, vai aos poucos configurando uma verdadeira geopolítica da infraestrutura. Não se trata apenas da rede tentacular de rodovias, ferrovias e portos, em si, mas da capacidade de atração de novos investimentos e da abertura de mercado para exportações chinesas. Em decorrência da influência política.

Na Ásia o mapa de investimentos impressiona. A Nova Rota da Seda cruzará a Ásia Central e prosseguirá em direção à Europa, criando um cinturão econômico em seu entorno. Ao sul, a Rota Marítima da Seda ligará o Oceano da China do Sul ao Oceano Índico. No sentido norte-sul, uma rodovia e um trem de alta velocidade conectarão a região de Yunnan com a Tailândia, enquanto o Corredor Econômico ligará por rodovia Bangladesh, China, Índia e Mianmar.

Com vista a conter a expansão econômica e a crescente influência política da China no espaço asiático, o governo de Barack Obama (EUA) anunciou em 2012 o chamado pivô para a Ásia, com o objetivo, entre outros, de reforçar as alianças militares e políticas com países na região. Pouco depois, lançou a Parceria Comercial Transpacífica (TTP, em inglês) – da qual a China foi excluída – para consolidar uma zona econômica sob influência americana. Mas esses passos não parecem suficientes, ao ver de analistas e congressistas norte-americanos. Em estudo recente, o Council on Foreign Relations, um dos mais conceituados think tanks norte-americanos, condenou a política de acomodação do governo Obama perante a China e preconizou uma nova estratégia política, militar e econômica para defender “os interesses vitais dos Estados Unidos nessa vasta região”.

De certa maneira e em menor grau, Xi Jinping parece replicar na América do Sul a política norte-americana na Ásia. A presença da China na região já é marcante no comércio e nos investimentos. Em breve passará a ser também na infraestrutura, em decorrência dos acordos que concluiu com a Argentina e do convênio a ser assinado com o Brasil, por ocasião da visita de Li Keqiang, para a construção da via Transoceânica que ligará o Atlântico ao Pacífico, cruzando o Centro-Oeste e o Peru. A provável participação de investimentos chineses na rede de ferrovias – interligadas à Transoceânica – para o escoamento dos grãos produzidos no Centro-Oeste porá as empresas chinesas numa posição privilegiada em todo o complexo soja, pois atuarão na originação do grão, no armazenamento, na logística de transporte, incluídos terminal e porto, exportação e comercialização no mercado chinês.

Brasília joga, assim, ao lado de Beijing em vários dos tabuleiros em que se vai desenhando a emergência da China, econômica primeiro, política em seguida. Defendemos, legitimamente, maior participação dos países emergentes na governança internacional. Somos parceiros na criação de instituições financeiras alternativas. Assinamos acordo de troca de moedas. Estamos associados em projetos estratégicos em nosso subcontinente.

O Brasil tem na China não só um parceiro estratégico, mas um parceiro que tem estratégia. Resta saber se nós também temos uma visão clara de nossos interesses e objetivos, especialmente no momento em que Estados Unidos e China iniciam um capítulo novo de competição mais acirrada por mercados e áreas de influência.

domingo, 10 de maio de 2015

Um juiz mais importante que Barbosa ou Moro

Um juiz mais importante que Barbosa ou Moro

Hélio Gurovitz - Epoca


O juiz em questão chama-se Ivan Ilitch Golovin, personagem do escritor russo Lev Tolstói


Preste atenção a este juiz. Não se trata de nenhum ministro do STF, do STJ, nem de nenhum tribunal superior. Não é desembargador nem uma das estrelas que ocuparam o noticiário em tempos recentes, como Joaquim Barbosa ou Sergio Moro. O juiz em questão chama-se Ivan Ilitch Golovin, personagem do escritor russo Lev Tolstói. Graças a obras-primas como Guerra e paz e Anna Karenina, Tolstói entra em qualquer lista dos maiores romancistas de todos os tempos. É nos contos e nas novelas curtas, porém, que ele demonstra toda a sua força. A morte de Ivan Ilitch é considerada a mais perfeita novela jamais escrita. Pelo tema, pela forma como a história é contada e pela capacidade de pegar qualquer um de nós de imprevisto – e de nos pôr contra a parede.

A narrativa começa com uma cerimônia fúnebre em torno do corpo do juiz Ivan Ilitch, titular do Tribunal de Justiça, numa província da Rússia czarista. Nem bem o cadáver está no caixão, seus colegas disputam a sucessão e discutem quem ocupará o lugar de quem com o posto vago. A mulher chama a um canto o amigo mais próximo do marido morto para perguntar-lhe como seria possível extrair mais dinheiro do governo. Seus antigos confrades escapam da cerimônia para uma partida de cartas, que não havia como cancelar. Tolstói conta, a partir daí, como Ivan Ilitch levara uma vida exemplar para os padrões da sociedade russa. Formara-se em Direito, casara-se, tivera filhos e conquistara gradualmente posições no Judiciário. Seu sucesso fora coroado com a nomeação para o cargo de juiz no interior. O trabalho preenchia sua vida. Julgava os casos mais difíceis sem misturar questões pessoais e profissionais. Respeitado na comunidade local, usufruía com prazer o poder de decidir o destino alheio. Até que sofre uma queda ao instalar uma cortina em sua casa nova e, a partir daí, sua saúde degringola. Ele entra numa lenta decadência física, assistido por médicos incapazes de curar uma doença misteriosa, que lhe afeta ora o rim, ora o apêndice. Especialistas são consultados, estrelas da medicina demonstram a impotência da ciência diante da palavra-chave de Tolstói: o “inexorável”. Ivan Ilitch é forçado a deixar o trabalho, abandonado ao leito pela família e pelos amigos. Encontra consolo apenas no ópio que lhe alivia as dores insuportáveis e no apoio que recebe de um criado. Acamado, moribundo, começa a refletir sobre como pode uma doença sem cura aparente atingir alguém tão correto. Lá pelas tantas, pergunta-se: “Quem sabe eu não vivi como devia? Mas como assim, não como devia, se eu fiz tudo como era devido?”. O arrependimento toma conta de seus últimos pensamentos até que, aos 45 anos, sobrevém o “inexorável” – ele morre.

Conde da nobreza russa, Tolstói era um conservador. Desconfiava das aparências sociais, das ilusões políticas e de todo pensamento que vislumbrasse algum tipo de ordem no caos da vida e da história. Não acreditava nas teorias tão em voga em seu tempo, como socialismo, positivismo, ou mesmo liberalismo. “Tolstói rejeitava a reforma política por acreditar que a regeneração definitiva poderia vir apenas de dentro, e que a vida interior só poderia ser vivida de verdade nas profundezas intocadas das massas populares”, escreveu o pensador Isaiah Berlin em seu monumental ensaio O ouriço e a raposa. Foi tal crença que levou Tolstói, já mestre reconhecido da literatura russa, a abandonar as letras para levar uma vida frugal com a mulher e os 13 filhos na propriedade rural de Iasnaia Poliana, a 200 quilômetros de Moscou. Idoso, barba de profeta, esnobado pelo comitê do Prêmio Nobel, absorto em suas ideias pacifistas e em sua versão particular do Cristianismo, resolveu abandonar a própria família. Legou os direitos de suas obras ao povo russo e passou a viver como pedinte de uma cidade a outra da Rússia.

A morte de Ivan Ilitch foi publicado em 1886, quando Tolstói já largara a literatura. Berlin argumenta que, mesmo desprezando os teóricos intelectuais, Tolstói era um deles – acreditava na existência de alguma ordem mais profunda, capaz de explicar a realidade. Apenas não acreditava na nossa capacidade de encontrá-la ou de entendê-la. Não era, para usar a metáfora de Berlin, um “ouriço”, alguém que vê tudo através do prisma de uma teoria única. Era uma “raposa”, cujo refinamento e compreensão das múltiplas facetas da alma humana o tornavam capaz de esmiuçar e desmontar qualquer teoria que desse alguma aparência de ordem à vida. Não escolheu um juiz como personagem à toa. Juízes são o maior símbolo da ordem social que tanto desprezava. Não houve PEC da Bengala para Tolstói. Ele se manteve ativo até morrer, em 1910, aos 82 anos. A morte de Ivan Ilitch mostra que o mais importante não é a idade com que juízes, escritores ou qualquer um de nós nos aposentamos – nem quando ou como morreremos. É o que fazemos antes disso.

Ajuste ou desmanche? - Eliana Catanhede


Ajuste ou desmanche? - ELIANE CANTANHÊDE
O ESTADÃO - 10/05

A aprovação da primeira fase do ajuste fiscal foi uma vitória do governo e dá um certo alívio para Dilma Rousseff, mas ainda falta passar pelo Senado e não se pode esquecer que esse ajuste é parte do desmanche de todo o primeiro mandato da presidente. Basta repassar as prioridades entre 2011 e 2014 para confirmar que não sobrou pedra sobre pedra.

Uma por uma, Dilma vem abandonando aquelas ideias que tirava da própria cabeça – não raro passando por cima da área técnica e da perplexidade do mercado – e anunciava com pompa e circunstância. Com o abandono e o desmanche, viram sucatas.

Nem o modelo de exploração do pré-sal resiste à realidade, apesar de Dilma ter feito carreira na área de energia e de ter ocupado, inclusive, o Ministério de Minas e Energia. Depois de tanta badalação, tanta aula com PowerPoint, tanta picardia contra o modelo tucano, o governo volta atrás, falando em deixar o sistema de partilha de lado para recuperar o de concessões, acabando com a obrigatoriedade de a combalida Petrobrás participar de todos os blocos.

Até o Pronatec, um dos carros-chefe dos debates, dos programas de TV e do dia a dia da campanha da reeleição, está devagar. Com a crise na economia, dissimulada no limite da irresponsabilidade, Dilma só conseguiu pagar os subsídios das entidades privadas até outubro, mês da eleição. Depois disso, atrasos, confusão, incerteza.

Outro que embalava o marketing dilmista era o Fies. Sem desprezar os objetivos corretos e as boas intenções, também encheu as burras de universidades de desempenho sofrível e brindou estudantes pobres com diplomas capazes de embelezar paredes, mas de serventia duvidosa para lhes garantir empregos em suas áreas. Em 2014, havia 4,4 milhões de bolsistas, com financiamento de R$ 13,4 bilhões para escolas privadas – boas ou arapucas. Sem dinheiro, muitos dos bolsistas e das escolas estão a ver navios.

E o financiamento da casa própria? É bem verdade que Dilma ainda viaja pelo País – quando não corre o risco de panelaços –, entregando milhares de unidades do Minha Casa Minha Vida, como fará na próxima terça-feira, no Rio. Mas, com o pior resultado da caderneta de poupança em 20 anos (20 anos!), lá se foi o crédito para moradia. A Caixa Econômica Federal limitou o financiamento de imóveis usados à metade do valor total e acaba de anunciar aumento dos juros da compra de casas.

Dilma estufou o peito num pronunciamento em cadeia de rádio e televisão porque tinha decidido na marra a redução da conta de luz para residências e empresas. Patrões, empregados e eleitores em geral bem sabem o que aconteceu depois da eleição. Ou melhor: o que vem acontecendo todo mês, quando a conta bate à porta e arromba o bolso.

Num outro pronunciamento oficial, a presidente se vangloriou da redução dos juros como nunca antes neste país e ainda estendeu um dedo ameaçador para os bancos privados, ordenando que eles fizessem o mesmo. E, afinal, onde foram parar os juros?

A venda de carros caiu 25,2%, no pior abril em oito anos. Mais de 250 lojas foram fechadas. Mais de 12 mil trabalhadores do setor foram para o olho da rua. E a indústria em geral? A produção industrial caiu 5,9% no primeiro trimestre de 2015. É mole?

O desastre afeta outro indicador importante, que ajudou muito o trabalho dos marqueteiros e foi importante para segurar o discurso e os votos da reeleição: o emprego. No entanto, segundo os dados oficiais, o desemprego já subiu para 7,9% no primeiro trimestre. Sabe-se lá onde isso vai parar.

Então, é ótimo que o ajuste fiscal comece a ser aprovado no Congresso e que novas perspectivas se abram para o País, mas não se pode esquecer que isso tudo é parte do desmanche que derrubou a popularidade de Dilma de quase 80% no início de 2013 para 13% em 2015. E agora, com o desmanche do primeiro mandato, a grande pergunta é: para construir o que no lugar?

Soltos - Marcos Rolim

domingo, maio 10, 2015

SOLTOS - MARCOS ROLIM

ZERO HORA 10/05

O argumento fundamental da decisão da segunda turma do STF pela soltura de nove executivos de empreiteiras investigadas na Operação Lava-Jato que estavam em prisão preventiva foi o princípio da presunção de inocência. Os réus, entretanto, foram encaminhados à prisão domiciliar, receberam ordem de não conversar entre si, foram submetidos ao uso de tornozeleiras eletrônicas e tiveram passaportes apreendidos. Presume-se, portanto, que há o risco de que prejudiquem a instrução criminal e de que possam fugir do país. Neste caso, estamos diante de duas das exceções à regra da liberdade processual. Ou seja, as circunstâncias que poderiam justificar as medidas restritivas contra os acusados são aquelas que autorizam a prisão cautelar. Então, por que soltá-los?
No Brasil, há especial sensibilidade aos direitos dos poderosos. Proporcional ao desprezo pelos direitos dos mais pobres, acrescente-se. A prisão preventiva dos empresários poderia ser interpretada como constrangimento para estimular delações? Talvez. O que admitiria a dúvida: há constrangimentos legítimos no Estado de Direito? Imagino que sim. Aliás, possivelmente, a ausência da disposição de constranger réus poderosos estimule, e muito, a corrupção no Brasil. Não por acaso, Paulo Maluf só foi condenado definitivamente por tribunais no exterior. Por aqui não há sentença com trânsito em julgado contra ele. Ao invés de constrangimentos, Maluf é bajulado a cada eleição. Não se trata de caso isolado. Isolado foi o julgamento do “mensalão”. A regra sempre foi, e segue sendo, dispensar às pessoas “diferenciadas” toda a compreensão. Uma inclinação quase natural entre aqueles que Raymundo Faoro descreveu como “patronato político”. No âmbito judicial, esta marca estimula a criatividade jurídica e, diante de prova robusta, desconstitui a ação penal ou simplesmente obstaculiza o julgamento. Alguém dirá que o fenômeno é decorrência dos labirintos de legislação permissiva. Não é. O fato é que a decisão judicial é sempre uma decisão fundada em uma sensibilidade moral, aquilo que Obama chamou de “empatia judicial” (judicial empathy), diferente da ideia do magistrado como um “aplicador da lei”, um “árbitro” (umpire), síntese positivista preferida pelos republicanos. É tema relevante, portanto, na seleção dos magistrados, a natureza de suas sensibilidades morais. Sem as virtudes requeridas pela função _ como a coragem necessária para contrariar interesses poderosos _ saber jurídico e garantias como a vitaliciedade são imprestáveis.
Não estou seguro quanto aos fundamentos empregados na decisão. Para os que atuam na defesa dos empreiteiros, ela garantiu direito elementar e motivos para comemoração. Para o Brasil, talvez tenha garantido a vitória do cinismo.

Benefícios da crise

A crise oferece oportunidades valiosas para corrigir erros históricos. Na semana passada, houve a votação das modificações no seguro desemprego, com a inclusão de critérios mais restritivos para sua concessão. Buscou-se, sobretudo, economizar recursos do Estado, mas houve repercussões positivas ao inibir-se abusos que poderiam inviabilizar a sustentabilidade daquele instrumento de seguridade social.
A falta de dinheiro força o Governo a empregar melhor os recursos públicos. A revelação dos escândalos de corrupção revelam a verdadeira identidade dos governantes e impele a população a posicionar-se politicamente, exigindo competência e honestidade daqueles que conduzem a administração pública.
Sim, a crise pode ser proveitosa, mas será desastrosa se pouco se fizer para impedir que os velhos erros se repitam.
O mais importante de tudo é castigar os corruptos e corruptores. A corrupção é uma ofensa intolerável à estrutura moral da sociedade, sua existência prejudica a eficiência no emprego dos recursos públicos e sua repetição provoca o surgimento de novas crises.

sábado, 2 de maio de 2015

A orfandade do Brasil profundo

"A orfandade do Brasil profundo", por Ruy Fabiano

Com Blog do Noblat - O Globo


O abismo entre os dois brasis é profundo e nenhum partido diagnosticou o problema. A queda do PT não o resolve, mas abre caminho para que uma interlocução se estabeleça

  •  
Abismo entre os brasis  (Foto: Arquivo Google)
O Brasil, como salta aos olhos, é um país dividido. E a divisão não é apenas partidária, que é sua manifestação mais superficial e circunstancial, já que o brasileiro não crê em partidos.
A mais densa manifestação divisionista se constata entre sua elite universitária, politicamente correta – uns dez por cento da população - e o restante da sociedade, da classe média para baixo.
As pesquisas tangenciam o problema. O chamado Brasil profundo é religioso, conservador em seus costumes e valores e com uma visão realista das questões do cotidiano (maioridade penal, liberação das drogas e do aborto, desarmamento, entre outras) - o avesso do que propugna o Brasil politicamente correto.
Este – e aí incluem-se os formadores de opinião, estudantes e professores universitários, profissionais liberais e a militância de esquerda (centrais sindicais, ONGs, movimentos sociais) – fala outro idioma, embora se arvore a falar por todos.
Não se trata de uma tese, mas de fatos. O Brasil profundo, segundo pesquisas diversas, rejeita, por exemplo, o casamento gay. Por essa razão, nenhuma proposta nesse sentido foi submetida ao Congresso ou mesmo, via plebiscito, ao povo.
Buscam-se então vias alternativas. Assim, a autorização veio pelo Supremo Tribunal Federal, respondendo a consulta, contra a letra explícita da Constituição. A união civil estável sob a proteção do Estado, objeto da consulta, é tratada no parágrafo 3º, do artigo 226, nos seguintes termos: “Para efeito da proteção do Estado, é reconhecida a união estável entre o homem e a mulher como entidade familiar, devendo a lei facilitar sua conversão em casamento”.
Apesar disso, o STF decidiu legislar: estendeu-a aos homossexuais. Na sequência, o Conselho Nacional de Justiça, sem qualquer base legal, autorizou os cartórios a realizar casamentos – e não apenas união civil estável sob a proteção do estado -, indo além da transgressão anterior.
Não se trata aqui de discutir o mérito da iniciativa, mas como foi obtida: à revelia da maioria, sem consultá-la – e mesmo já sabendo o que esta expressara, por meio de diversas pesquisas.
Idem o desarmamento. Em plebiscito de outubro de 2005, dois terços da população se manifestaram contrários à proibição da venda de armas de fogo – mas e daí? O Brasil politicamente correto, que se diz democrata, afronta a maioria e busca expedientes por meio de portarias administrativas, que contrariam a vontade explícita da maioria. O Congresso é também ignorado.
O mesmo Brasil real é contra a legalização do aborto, considerando que as exceções já acolhidas em lei – risco de vida da mãe, estupro e feto anencefálico – são suficientes. Mas a agenda politicamente correta insiste em ampliá-lo.
O deputado Jean Wyllys, que simboliza uma ala do politicamente correto, acha que, em questões assim, o povo não deve ser consultado, pois seguramente “votaria errado”. Ou seja, sente-se tutor da população em questões comportamentais.
Há uma determinação, de índole positivista, de impor às massas ignaras um novo país, moldado por valores que não compartilha e que não é chamado a debater.
A chave dessa divisão está no sistema educativo. Há décadas – e isso remonta ao tempo do regime militar -, a agenda politicamente correta, que contesta valores da formação cristã tradicional, que moldou o pensamento da população brasileira desde a colonização, vem sendo imposta nos colégios e universidades, sobretudo no meio urbano. Há mais de uma geração já submetida a esse software educacional, que prepara o país para sua total esquerdização, por meio de uma revolução cultural no melhor estilo gramsciano. E isso gerou dois brasis.
A própria Igreja Católica submeteu-se a essa polarização. Em 64, posicionou-se contra a esquerda; hoje, a apoia, via CNBB. Idem a OAB, hoje transformada em célula do PT. O fenômeno, complexo, é, no entanto, tratado de forma simplista.
O presidente do PT, Rui Falcão, adverte contra uma “conspiração conservadora”, que estaria promovendo “o renascimento da direita”, como se por trás da voz das ruas, que descrê dos partidos e da própria política, estivesse, como proclamou o sábio Sibá Machado, líder do governo na Câmara, “o braço da CIA e do imperialismo”. A realidade é outra: o PT aparelhou a sociedade civil organizada, mas não o Brasil profundo.
Aparelhar 200 milhões e varrer os valores essenciais que moldaram a construção de uma nação de meio milênio, exige, se é que é possível, mais tempo e melhor conteúdo.
Xingar de “fascistas”, “reacionários” e “direitistas” os milhares de manifestantes que ocupam as ruas – e os milhões que se manifestam de casa -, e que rejeitam a imposição de uma agenda avessa a seus costumes, é inútil e ridículo.
O abismo entre os dois brasis é profundo e nenhum partido sequer diagnosticou o problema. A eventual queda do PT não o resolve, mas, ao menos, abre caminho para que uma interlocução se estabeleça. É preciso repensar o país real, em vez de insistir, como os positivistas que há 126 anos proclamaram a república, em conduzi-lo como um rebanho inepto a um projeto de paraíso que só existe na cabeça dos que o conceberam.