domingo, 1 de setembro de 2013

Síria e os ensinamentos da história



Toda crise oferece suas próprias lições e os três séculos e meio desde a paz de Vestfália encerram vários ensinamentos na longa história das relações entre os Estados Nacionais. Na história moderna, é recentíssima a formação dos países do Oriente Médio.
Cem anos atrás, Síria, Iraque, Arábia Saudita e outros eram províncias do Império Otomano e sua conformação como Estados foi decidida pelas potências vencedoras da primeira guerra mundial, mas levando-se em conta também os interesses da elite política regional. Daí, juntaram-se grupos étnicos distintos num mesmo país e nações foram segmentadas. Isso explica, pelo menos em parte, os ódios e disputas que instabilizam aquela parte do planeta.
Além disso, como ponto de encontro entre os continentes, o Oriente Médio é palco de disputas de espaço de poder e influência. As grandes jazidas de petróleo na região adicionam mais um ingrediente a esse caldo de conflitos.
Chegamos então à Síria, onde há mais de dois anos uma guerra civil vem produzindo milhares e milhares de mortos, destruindo as estruturas do país e deslocando expressiva parte de sua população na busca de refúgio, de algum local onde se possa viver sem a perspectiva sombria de repentinamente morrer de bomba, de tiro ou de veneno.
Nesta última semana, as imagens de crianças mortas por armas químicas, supostamente lançadas por tropas do governo sírio, chocou a opinião pública mundial e levou a um intenso debate sobre o que deve ser feito. Como costuma ocorrer, espera-se que a  principal potência mundial encontre uma solução que impeça novas mortes de inocentes.
A crise Síria possui  componentes dramáticos, cruéis e inusitados. Não é fácil resolvê-la. Para isso, será preciso levar em conta a história regional e os ensinamentos colhidos em outros conflitos.
Há quem recomende extrema cautela, pois é grande o perigo de se espalhar uma guerra que hoje está contida nas fronteiras sírias. Outros são mais pragmáticos; enxergam o ditador sírio como o menor dos males, a opção menos danosa para o equilíbrio político regional.
Remeto o leitor, então, a dois acontecimentos da história.
Lembro que, durante os anos trinta, foi infrutífera a tolerância de Chamberlain ao expansionismo de Hitler. Sem freios, o ditador alemão levou adiante seu apetite  de poder, que acabou provocando a segunda guerra mundial.
Cinquenta anos depois, a tolerância do ocidente aos massacres da população curda  iraquiana, também utilizando armas químicas, levou Sadam Hussein a confiar na impunidade por seus atos, motivando-o a invadir o Kuwait.
Hoje, há quem critique o presidente dos EUA por ele ainda não ter agido contra o governo sírio. Ao revés, outros o criticam por sua opção em tomar as medidas contra o ditador Assad. Eu discordo de ambas as críticas.
Obama deixou claro os limites de sua tolerância e, mesmo assim, o governo sírio os ultrapassou.
O uso de armas químicas poderia oferecer alguma vantagem no terreno tático, mas é moralmente inaceitável. Deixar o regime de Damasco sem punição será o mesmo que convidá-lo a continuar usando aquelas armas contra seus adversários e mesmo contra outros países da região.
A situação exige ação, mas também cautela. Obama tem dado repetidos avisos e oportunidades ao governo sírio, que ainda tem uma saída. Basta entregar os responsáveis pelo ataque do dia 21 de agosto para julgamento  no Tribunal Penal Internacional.
Entregar um bode expiatório para os crimes do regime seria uma resposta aceitável e ofereceria maiores chances de sobrevida ao governo Sírio.
Isso deu certo com a Líbia, nos anos oitenta, quando um agente da inteligência daquele país foi entregue para julgamento pela Grã-Bretanha  pela explosão do avião da PANAM sobre a cidade escocesa de Lockerbie, um atentado com fortes indícios de ter sido determinado pelo ditador Kadafi.
A história oferece lições e ensinamentos. Precisa ser lida e levada mais a sério, principalmente por quem tem as melhores condições de conduzir os acontecimentos.

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