quinta-feira, 29 de setembro de 2011

Bolsa Verde neles!

O Brasil é um país abençoado e uma potência agrícola. Tenho meus motivos para dizer isso. O primeiro é que se pode aumentar a quantidade de terras para a agricultura sem a necessidade de novos desmatamentos.
Aliás, essa possibilidade de aumento da produção deveria ser explorada por meio de uma política agrícola que estabelecesse objetivos factíveis e destinasse recursos para financiar, por exemplo, a recuperação de antigas áreas de pastagem.
Hoje, mesmo a dita agricultura familiar é uma atividade que requer dedicação e conhecimento técnico. Também é sujeita a vários riscos, às intempéries da natureza e dos mercados consumidores.
Não tenho dúvidas da pertinência da agricultura num mundo carente de alimentos, onde só cresce a multidão de chineses que rompe a barreira da miséria e bota mais comida no prato.
E no Brasil, os mesmos programas sociais que eu tanto desconfiava e criticava conseguem resultados positivos. Mais gente comendo mais.
A equação é simples. Mais prosperidade significa mais consumo de alimentos.
Não há sentido em se falar de distribuição de terras a quem não tem capacidade nem vontade de utilizá-las. Terra tem que produzir e não ser usada para especulação econômica ou política.
O sujeito que vive do campo não precisa de discursos bonitos, de marchas na Esplanada dos Ministérios, de foice e facão para desfile. Ele precisa é de ajuda técnica, financiamento, condições de escoamento de sua produção, segurança contra intempéries.
Por isso, não gosto do MST, que desperdiça o nosso tempo e o de milhares de agricultores num discurso vazio, anacrônico, fossilizado.
Quer saber? Bolsa Verde neles!

Estado Palestino.

O ingresso da Palestina como Estado-Membro da ONU dependerá da aprovação do Conselho de Segurança, um órgão anacrônico, formalmente criado para zelar pela paz e segurança internacionais, mas que, na prática, mantém a mesma conformação de poder do final da Segunda Guerra Mundial.


Atualmente, não há sentido no poder de veto da França e da Inglaterra, duas ex-potências mundiais que, no Sistema Internacional, têm menor relevância que a Alemanha e o Japão, por exemplo.


Em todo caso, a criação do Estado Palestino alinha-se ao princípio da autodeterminação dos povos, defendido pela ONU e que motivou os movimentos de descolonização a partir de meados do século passado.


A resistência de Israel à criação do estado palestino dá margem a várias ilações. Uma delas  seria o receio de sua condenação pelos órgãos de defesa dos direitos humanos da ONU.


Há uma quase certeza de que os Estados Unidos usarão o seu poder de veto para impedir a criação do estado palestino. Tal fato leva a algumas indagações. Afinal, é curiosa essa interligação dos Estados Unidos com Israel.


O estado judeu é um enclave no oriente médio. Um país artificialmente criado pouco após a Segunda Guerra Mundial e admitido pelo sentimento de culpa coletiva da comunidade internacional após a revelação do abominável genocídio dos campos de concentração.


Israel é um país que destoa na região onde se situa. Para começar, é uma democracia e abriga uma sociedade sofisticada, com alta qualidade de vida. Depois, conseguiu consolidar sua existência num ambiente fortemente hostil, domando as pouco generosas condicionantes geográficas e a intolerância de seus inimigos. Por fim, construiu uma economia diversificada e dinâmica.


Durante muito tempo, os países árabes exigiram a extinção de Israel. Com a consolidação do Estado Judeu, suas reivindicações se deslocaram para a viabilidade do Estado Palestino.


Os Estados Unidos são um país hegemônico, a única superpotência do mundo. Essa condição lhe permite muita liberdade de ação para impor seus interesses, mas também lhe traz responsabilidades. Felizmente, trata-se de uma nação construída sobre valores positivos, como o respeito pela liberdade, pela democracia e pelos direitos humanos.


O povo americano sabe que sua prosperidade e bem-estar se condicionam à incorporação de seus valores pelos outros países. De certo modo, seu apoio irrestrito a Israel dificulta a pacificação do oriente médio.


Com o veto dos Estados Unidos, os jovens palestinos queimarão mais e mais bandeiras norte-americanas e jogarão ainda mais pedras nos policiais israelenses.


Muitos já morreram nessa guerra e, num mundo tão diferente do de sessenta anos atrás,  parece que a cristalização das posições no Oriente Médio é tão anacrônico como o Conselho de Segurança da ONU.

Demissão do Comandante da PMRJ

O Comandante-Geral da PMRJ, Coronel Mário Sérgio, pediu demissão depois que um oficial que nomeara para um comando foi preso, implicado no assassinato de uma juíza. O coronel saiu para preservar sua instituição, assim como o governador que o havia nomeado para o Comando-Geral da PM.
No meu entendimento, foi uma atitude louvável.
Por aqui, o comandante-geral dos carabineros foi forçado a pedir demissão depois uma semana de intensos desgastes devido ao assassinato de um jovem por integrantes de sua corporação. 
O jovem morrera devido a um disparo de arma de fogo, durante uma greve da Central Única dos Trabalhadores do Chile.
No início, o comandante dos carabineros não quis sequer aceitar a hipótese de que algum de seus comandados tivesse participado do crime. Afinal, ele proibira o uso de armas de fogo e a corporação é reconhecidamente disciplinada.
Contudo, depois de uns dois dias de interrogatório, um carabinero confessou ter disparado sua metralhadora contra o jovem. Não restou alternativa ao comandante senão ir a público pedir desculpas à família do jovem assassinado.
Mas isso não bastava. Os políticos exigiram sua renúncia. Curiosamente, há algum dispositivo legal que impede que o ministro demita o comandante dos carabineros. Aquele comandante não quis dobrar-se às pressões e permaneceu no cargo.
Misteriosamente, poucas horas após o comandante negar sua renúncia,  veio à tona um incidente de menor gravidade envolvendo seu filho. A polícia, provavelmente por apadrinhamento, teria encoberto uma infração de trânsito cometida pelo rapaz.  
Tudo bem, esse tipo de atitude é condenável. Entretanto, a infração teria ocorrido um ano antes e só veio a público com o propósito de forçar o comandante à renúncia. 
Ficou claro a elaboração de um dossiê contra o comandante, divulgado com propósitos políticos.
Ninguém se interessou em reclamar dessa manipulação. Pelo contrário, a imprensa reforçou suas pressões e o comandante, para preservar sua família e sua instituição, renunciou.
Curiosamente, poucas horas após a renúncia, um avião caiu na Ilha de Juan Fernandes, provocando uma comoção nacional. 
De uma hora para outra, os noticiários só tiveram olhos para o avião desaparecido no mar. Não havia espaço para nenhuma outra notícia. Ou seja, se o comandante resistisse um pouco mais, provavelmente as denúncias contra ele teriam arrefecido e ele conseguiria manter-se no seu cargo.
Os dois acontecimento mostram que ambos comandantes, o da PMRJ e o dos carabineros, fizeram bem em renunciar. As instituições estão acima das pessoas e no mundo não existe opinião pública, mas sim opinião publicada.
Os casos servem de ensinamento. Afinal, como diria Maquiavel, na política a ética é diferente.

O que me irrita no Chile

Meus amigos, a vida aqui no Chile é difícil.
Evidentemente que minha crítica não se refere a alguma falta de mercadorias no supermercado, ônibus velhos e superlotados ou a ausência de condições de vida.
Não, muito pelo contrário. Um terço da população do Chile vive em Santiago que é uma cidade moderna, bonita, organizada e muito limpa. O metrô daqui é uma coisa de primeiríssimo mundo e o pessoal costuma respeitar regras por aqui.
Os chilenos são respeitosos e, além disso, são boa gente. 
Sim, os chilenos são muito gente boa, mas são complicados. Ou em português castiço, bitolados. Dizem que são assim porque são gente da montanha, acostumados a viver regradamente. Isso pode ser bom, mas também irrita.

Acabo de desligar o telefone depois de vinte minutos de conversa irritante e inútil. É que tentei pedir a entrega de água mineral em minha casa.
Em Brasília, esse é o tipo de operação que não dura mais do que um minuto. A gente liga, pede e em dez minutos um motoqueiro aparece no seu portão com os botijões.
Bem, em Santiago, a coisa é diferente.
Nos vinte minutos de ligação, o máximo que consegui foi pedir para me enviarem um formulário de inscrição na empresa.
Primeiro, terei de me inscrever para depois pedir a água. A empresa levará dois ou três dias para entregar os botijões na minha casa.
Haja paciência!
A historinha da água repete um padrão. 
Levaram um mês para colocar o visto no meu passaporte e há mais de dois meses que aguardo a chegada da minha mudança.
A companhia de mudança daqui me exigiu uma série de documentos. Todos autenticados, naturalmente. Fui ao cartório para reconhecer minha firma e não o fizeram porque apresentei o documento de identidade e exigiram a apresentação do passaporte. Tive de ir em casa pegá-lo. 
Ah, além de reconhecer a assinatura, tive de botar as minhas digitais no documento. 
Depois de uma gincana nos cartórios, consegui reunir toda papelada. Agora, espero há mais de três semanas pelas minhas seis caixas, que totalizam míseros três metros cúbicos  e contém brinquedos da minha filha e sapatos e roupas de frio da minha esposa. Ah, para constar, nesse tempo de espera, o inverno acabou e já estamos na primavera.
As duas chegaram há um mês e se viram com as roupas que couberam em duas malinhas.
Tudo por aqui é controlado demais. Controles irritantes e, convenhamos, inúteis.
É por isso que a vida é tão difícil por aqui.
Nesse aspecto, o brasileiro é imensamente mais flexível e prático.

Por fim, quem visitar Santiago deverá beber é água da torneira. Pelo menos para isso não precisará preencher formulários e mais formulários ou apresentar documentos originais devidamente acompanhados das digitais.